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segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Julgamento dos alunos das escolas particulares

Atenção: Este texto é puramente fictício e qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência. Desde já admito que não tenho conhecimento algum de ciência jurídica e não sei como funciona um real julgamento.
Leitura da sentença: São acusados os alunos das instituições de ensino da rede privada de roubar as vagas dos estudantes das instituições públicas nas universidades federais e estaduais.

Os réus não estão presentes, pois não caberiam no tribunal, então foram convocados alguns acusados para falar por todos. Entra a primeira acusada.

Promotor: A senhorita passou para o curso de Medicina da Universidade Federal de Confim da Terra pelo concurso vestibular do ano passado?
Acusada: Sim, senhor.
P: Sua escola era particular ou pública?
A: Particular.
P: A senhorita estudava em qual turno?
A: Manhã e tarde.
P: Fez cursinho preparatório?
A: Sim, aos sábados de manhã e às segundas, quartas e quintas feiras à noite.
P: Quantas horas de estudo diárias costumava ter?
A: Oito horas no colégio, e mais quatro horas de estudo em casa.
P: Já trabalhou alguma vez na vida?
A: Nunca.
P: Seus pais têm condições financeiras de pagar uma faculdade particular?
A: Sim.
P: Por que, então, a senhorita optou por cursar uma universidade pública?
A: Porque as faculdades públicas têm conceito muito maior no mercado de trabalho.
P: Então a senhorita confessa ter passado doze horas diárias estudando para obter uma vaga que era por direito de alguém que não tinha condições de pagar uma faculdade particular? Admite então que roubou a vaga de um estudante de escola pública que ficou sem professor de várias matérias e que tinha de trabalhar para ajudar no sustento da família?
A: Não estudei para roubar a vaga de ninguém, estudei porque queria muito passar no vestibular para garantir meu futuro profissional.
P: E quem é que vai garantir o futuro profissional do grande contingente de estudantes que não têm as suas condições?
A: Mas a falta de condições dos colégios públicos é problema do Estado!
P: Protesto! A ré está ofendendo o Estado.
Juíz: Protesto aceito.
Promotor: Sem mais perguntas.

A assistência fica agitada e alguém grita:

_Por acaso os alunos das escolas particulares têm culpa do descaso das autoridades para com a educação pública?...
Juíz: Silêncio!
_Não são eles tão cidadãos quanto qualquer estudante da rede pública?
Juíz: Ordem no tribunal!
_A Constituição não diz que todos são iguais perante a Lei?
Juíz: Tirem este homem daqui.

O homem é tirado do tribunal pelos seguranças.

Promotor: Os alunos das escolas particulares têm roubado as vagas dos estudantes das escolas públicas há anos. Eles estudam como loucos com o intuito mesquinho de furtar a vaga alheia, para que os mais pobres não tenham condições de competir com eles no mercado de trabalho. Eles são egoístas e só pensam em seu próprio futuro.
Advogado: A precariedade do ensino nas escolas públicas não é culpa destes alunos que ainda nem trabalham! Ora, se os pais deles pagam os impostos e votam como quaisquer outros cidadãos, as universidades públicas são também direito deles.
Promotor: Pode até ser que sejam, mas eles não podem ficar com todas as vagas.
Advogado: Todos são iguais perante a Lei e devem concorrer às vagas igualmente, e deve passar quem obtiver a maior nota.
Promotor: Mas então os estudantes das escolas públicas continuarão sendo minoria nas universidades, e nós precisamos defendê-los, já que são o maior número. Este bem que fazemos hoje com certeza terá reflexos a curto e médio prazo, e creio que ano que vem já começaremos a senti-los.
Advogado: É verdade.

Juíz: Eu declaro os estudantes das escolas particulares culpados por roubarem as vagas dos estudantes das escolas públicas nas faculdades, e eles cumprirão pena de concorrer a somente metade das vagas em toda e qualquer instituição pública de ensino superior no país.
Sessão encerrada

Fonte:

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Mais uma de Nietzsche

Certa vez lendo um dos meus livros me deparei com uma “teoria” do meu querido Nietzsche que vira-volta toca em minhas feridas. De começo repudiei a idéia porém com o tempo estou começando a adota-la. Em resumo dizm que as pessoas não amam umas as outras. Pensar que amamos é um equívoco, um erro, diz ele:
“Talvez esteja pensando naqueles que ama. Cave mais profundamente e descobrirá que não ama a eles: ama isso sim as sensações agradáveis que tal amor produz em você! Ama o desejo, não o desejado. (…) Ninguém deseja... ajudar os outros; pelo contrário, as pessoas desejam apenas dominar e aumentar seu próprio poder.”

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Fé cega, faca amolada

 
O episódio envolvendo o projeto Escola Sem Homofobia do MEC  e a marcha cristã contra o PLC 122 (que revê punições para quem viola a dignidade e os direitos de minorias vulneráveis, como idosos, pessoas com deficiências e LGBTs) me suscitaram uma questão que está ligada ao crescimento do fundamentalismo religioso e aos esforços deste para converter seus dogmas em leis para todos. A questão nos leva a crer que o Estado laico e de direito, as liberdades civis e o humanismo estão ameaçados pelo fundamentalismo cristão (católico e, sobretudo, evangélico neopentecostal).
Jean Wyllys: “O Estado é laico. É por ele que os congressistas devem lutar”.
Em primeiro lugar, quero ressaltar que não estou me referindo à totalidade dos crentes cristãos, mas apenas aos fundamentalistas. Conheço muitos crentes católicos e evangélicos que comungam do respeito (e até se sacrificam) pelas liberdades, pela justiça e pela humanidade. Eu mesmo fui educado no cristianismo católico e herdei, do catecismo e das comunidades eclesiais de base, o humanismo e o amor pelo outro que hoje defendo, embora não seja mais católico. Há muitos outros crentes que defendem o mesmo. Mas não é o caso dos fundamentalistas.
Cristãos fundamentalistas são aqueles que crêem na Bíblia sem interpretá-la. Acreditam nos fundamentos de sua religião como verdades absolutas e inquestionáveis – e a Bíblia, como um texto literário escrito em contexto histórico e social bastante diferente do nosso, na maioria de suas passagens não deve ser tomada ao pé da letra. O fundamentalismo religioso tem, então, total identidade com o fanatismo e com o obscurantismo.
As idéias de cristãos fundamentalistas acerca da homossexualidade – de que esta é uma doença ou um “pecado mortal” e que os homossexuais vivem em pecado e que, portanto, “não herdarão o reino dos céus” – são obscurantistas e fanáticas e abrem mão da razão.  Esses “cristãos” – muitos deles ocupando espaços na tevê, nas Assembléias Legislativas, Câmaras de Vereadores e no Congresso Nacional – querem que mulheres e homens vivam segundo leis e valores descritos em um livro (a Bíblia) escrito há dezenas de séculos antes de nós. Querem que joguemos fora todas as descobertas científicas e argumentos filosóficos acumulados nos últimos dois mil anos de discurso humano para vivermos conforme vivem os personagens da Bíblia. Não! Mulheres e homens precisam desenvolver suas virtudes e possibilidades humanas, precisam ser humanistas e lutar pelas liberdades civis.
Não se calar diante da tagarelice desses parlamentares e de outros fundamentalistas é, portanto, lutar pela respeito mútuo entre os diferentes, pela solidariedade entre os seres humanos, pela liberdade de crença e de descrença (sim, ateus e agnósticos têm o direito de não crer e nem por isso devem ser considerados pessoas sem ética) e pela laicidade. Em seu Artigo 19, a Constituição afirma que o estado brasileiro é laico e que, como tal, não deve nem pode estabelecer preferências entre as religiões. O texto constitucional dá à pessoa humana o direito de acreditar ou não em um ser divino, mas, afirma que o estado não tem sentimento religioso.
A história nos mostra que o fundamentalismo em qualquer religião só leva as pessoas ao autoritarismo, à escravidão e à violência. Fundamentalistas não têm compromisso com a ética que assegura a vida nem com o bem-estar de todos. Essa gente quer estabelecer a paz dos cemitérios. Como diz a letra da canção, “fé cega, faca amolada”.