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sábado, 23 de março de 2013

O problema não é o Marco Feliciano e sim uma cultura que tenta fazer da Bíblia a fonte das verdades éticas e políticas de uma sociedade




por Paulo Jonas de Lima Piva
opensadordaaldeia.blogspot.com.br

O pastor Marco Feliciano é apenas um sintoma, apenas a ponta de um iceberg ameaçador para o futuro do Estado democrático de direito no Brasil. Do ponto de vista da democracia, dos direitos humanos, da laicidade do Estado brasileiro, Marco Feliciano é de fato um problema, um alerta, um lamentável retrocesso em potência e em andamento. Entretanto, o problema que o gerou e, ao que tudo indica, o problema que gerará pela frente muitos Marcos Feliciano, é ainda maior, e se protege atrás de um maciço tabu da nossa cultura hegemonicamente cristã: o de não se discutir no Brasil, de evitar a todo custo, uma reflexão mais pública e ampla sobre as bases da fé religiosa no país, mais exatamente, um debate sobre a veracidade dos livros que lhe servem de fundamento e justificação. Cientistas, pensadores e estudiosos para isso não faltam. Trata-se do tabu de que "religião não se discute", de que tolerância significa calar-se diante de absurdos e truculências cometidas em nome de uma fé. Mas pelo andar da carruagem, com a explosão de fé que contagiou o país nos últimos anos e com o aumento significativo da presença dos religiosos no cenário político nacional, lotando parlamentos e acumulando grandes meios de comunicação de massa, o futuro da laicidade do Estado brasileiro e da ampliação dos direitos humanos no Brasil exige com urgência tal discussão pública e ampla.


A Bíblia


Inspirando o fanatismo, a intolerância e o obscurantismo dos discursos e das práticas desse deputado eleito com mais de 200 mil votos e alimentando ideologicamente o seu projeto político de transformar o país numa "Jesuscracia" está um livro, a Bíblia. Para Marco Feliciano e para os milhares de cristãos que ele representa no Congresso Nacional, a Bíblia é um escrito sagrado, isto é, portador de explicações, valores e normas de conduta dados ao homem por uma divindade. Portanto, esse livro é por eles considerado uma obra oracular, concentradora de todas as verdades absolutas e únicas sobre o universo, o tempo, sobre a condição humana, sobre o certo e o errado, o permitido e o proibido, a vida e a morte. Assim sendo, não restaria outra alternativa ao ser humano senão submeter-se aos seus ditames e estórias, vinculando-se a ela sobretudo pela fé. Pensar, agir e viver fora dos padrões bíblicos seria viver em desacordo com as verdades com vê maiúsculo, por conseguinte, contra as vontades do deus no qual acreditam e a ele se dedicam e temem. Este seria o tal do "pecado".

Ora, o que está fazendo Marco Feliciano no Congresso Nacional? Marco Feliciano está apenas sendo coerente com o seu credo e leal ao eleitorado que o elegeu. Como deputado federal Marco Feliciano está sendo evangélico, seguidor do que ele acredita serem as palavras de um deus. Marco Feliciano está combatendo o mal, lutando contra o "pecado" na sociedade brasileira. Ao desqualificar eticamente os homossexuais em seu discurso e no seu engajamento homofóbico, Marco Feliciano mostra simplesmente que respeita e cumpre rigorosamente o que está escrito no seu livro sagrado. Ele segue à risca, por exemplo, Levítico 18:22: “Não te deitarás com varão, como se fosse mulher; é abominação.” Ele segue também Romanos 1:26-27: “Pelo que Deus os entregou a paixões infames. Porque até as suas mulheres mudaram o uso natural no que é contrário à natureza; semelhantemente, também os varões, deixando o uso natural da mulher, se inflamaram em sua sensualidade uns para como os outros, varão com varão, cometendo torpeza e recebendo em si mesmos a devida recompensa do seu erro”. Ou ainda 1 Coríntios 6:9: “Não sabeis que os injustos não herdarão o reino de Deus? Não vos enganeis: nem os devassos, nem os idólatras, nem os adúlteros, nem os efeminados, nem os sodomitas”. Sua misoginia também encontra fundamento claro na sua Bíblia, em 1 Coríntios 11:3, por exemplo: "Quero, porém, que entendam que o cabeça de todo homem é Cristo, e o cabeça da mulher é o homem, e o cabeça de Cristo é Deus". Também em Efésios 5:22-24: "Mulheres, sujeitem-se a seus maridos, como ao Senhor, pois o marido é o cabeça da mulher, como também Cristo é o cabeça da igreja, que é o seu corpo, do qual ele é o Salvador. Assim como a igreja está sujeita a Cristo, também as mulheres estejam em tudo sujeitas a seus maridos".

Portanto, a atuação parlamentar de Marco Feliciano é digna de orgulho para os cristãos que compartilham da sua fé. Trata-se de uma conduta politica absolutamente coerente com uma ideologia misógina, homofóbica e autoritária, de uma representação que reage e age, de maneira automática, em conformidade com as fábulas do livro no qual ele e seus milhares de eleitores cegamente acreditam. E por mais que muitos religiosos discordem do cristianismo expresso por Marco Feliciano e pelos seus milhares de eleitores, por mais que muitos teólogos façam contorcionismos lógicos e malabarismos retóricos mil para tentarem mostram que a Bíblia não diz o que realmente diz, quando abrimos as páginas enfadonhas, absurdas, ora assustadoras, ora risíveis, desse livro de mitologia, de contos da carochinha e de máximas bárbaras que tantas desgraças já causou ao mundo, o que encontramos lá? Como vimos acima, encontramos exatamente o que Marco Feliciano defende: passagens machistas, misóginas e homofóbicas aos montes, personagens autoritários, intolerantes e megalomaníacos que se apresentam como porta-vozes de um deus, que se dizem filho de um deus e, o que é pior, que se colocam como a encarnação da Verdade, sem contar as inúmeras atrocidades cometidas contra animais inocentes e alheios ao fanatismo dos personagens, animais estes condenados a rituais estúpidos de sacrifício. E é em coerência com esse livro digno de um Steven Spielberg sem inspiração que Marco Feliciano sustenta a sua homofobia, o seu machismo, o seu racismo, a sua intolerância, enfim, o seu desrespeito aos direitos humanos e à diversidade que caracteriza ainda o nosso ambiente democrático.

Resumindo e deixando mais claro, o problema central revelado pela eleição do presidente da Comissão de Direitos Humanos do Congresso Nacional não é o Marco Feliciano em si, que desfruta de um mandato legitimado por 200 mil eleitores seguidores da Bíblia, mas a nossa cultura de ainda levar a sério e de tomar como bússola existencial e moral um livro tão misógino, tão homofóbico, tão intolerante e autoritário como a Bíblia, onde o "amar ao próximo como a si mesmo", máxima que não é uma exclusividade evangélica, torna-se nota de rodapé em meio a tanta violência, sofrimento, crueldades, truculências e absurdos de suas "verdades" e personagens.



(Publicado em partes no jornal A Gazeta Itapirense, edição 407, 23 de março de 2013)

4 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. De fato, não há dúvida alguma de que a Bíblia. o livro considerado inspirado por Deus pelos cristãos, CONDENA a PRÁTICA DO HOMOSSEXUALISMO. Além das passsagens bíblicas citadas, há muitas outras em que essa condenação fica ainda muito mais explícita. Dai deriva que, ser cristão, é necessariamente ser CONTRÁRIO a prática do homossexualismo. Ser cristão seria necessariamente ser "homofóbico”, expressão que os militantes gays preferem chamar aqueles que condenam a prática do homossexualismo. Ocorre que, apesar da condenação a PRÁTICA do homossexualismo, apesar da PRATICA do homossexualismo ser considerado um “pecado”, isto é, uma transgressão a Lei do Deus dos cristãos, jamais o Cristianismo ensinou a prática da violência contra a PESSOA dos homossexuais. Aliás, a condenação do PECADO e o simultâneo acolhimento do PECADOR foi característica da pregação de Jesus Cristo; perdoa, mas pede para a pessoa não voltar a pecar. Por exemplo, Jesus perdoou a mulher que praticou o adultério (adultério é também um pecado, tanto quanto a prática do homossexualismo), mas em seguida Jesus diz: "Vai embora, mas NÃO VOLTES a PECAR". Dessa forma, considerando que a condenação dos cristão se dá somente contra a PRATICA do homossexualismo, mas sem promover a AGRESSÃO äs pessoas homossexuais, qual é o problema? Por que os cristãos não podem ter o DIREITO de pregar CONTRA A PRÁTICA DO HOMOSSEXUALISMO? O movimento pró-homossexuais quer impedir que um pastor ou um padre tenham o DIREITO DE PREGAR o Evangelho? Querem que eles OMITITAM de pregar a Palavra de Deus? Como fica a órdem dada por Jesus de pregar seu Evangelho (pregar contra o homossexualismo INCLUSIVE) “todos os dias até o fim dos tempos”? Os cristão vão passer a ser perseguidos por isso? Vamos voltar a época do império romano quando os cristãos eram crucificados ou jogados aos leões por insistirem em ser fiel ao evangelho? Ora, temos uma Constituição que além de assegurar a liberdade de culto, assegura também a liberdade de expressão. Dessa forma, os militantes gays NÃO CONSEGUIRAM CENCURAR os cristãos. Estes vão continuar a ter assegurado seu DIREITO de pregar o Evangelho, segundo está consignado na Bíblia Sagrada. Ora, se os cristãoa aprenderam a tolerar as pessoas dos homossexuais, apesar de não aprovar as PRÁTICAS DO HOMOSSEXUAISMO, por que os militantes gays não podem aprender também a TOLERAR os cristão, ainda que não concordem com eles quanto a condenação a prática do homossexualismo? Os militantes gays não são melhores do que os cristãos. Todos somos brasileiros e temos que APRENDER a conviver, especialmente com as pessoas que não pensam como nós.

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  3. O movimento gay não está solicitando que os direitos de pregação do evangelho seja cassado. O movimento gay e uma grande parcela da nossa sociedade, não aceita um presidente da Comissão dos Direitos Humanos, um religioso fanático que se baseia em dogmas religiosos. Temas vistos como "espinhoso" (Movimento LGTB, Casamento Civil Igualitário, Aborto e tantos outros) necessita ser abordado sem discurso moralistas e discriminatório. Cabe lembrar que o Estado é Laico. Portanto, não podemos aceitar que uma corrente religiosa tenha interferência em matérias sociopolíticas e culturais.

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  4. AS MINORIAS QUEREM VIRAR MAIORIA(RS)PATETICOS, MEU VIVEMOS UMA DEMOCRACIA MAS A MAIORIA É QUE PREVALECE, SEM QUE A MINORIA NAO SEJA AFETADA EM SEU DIREITO DE MANIFESTAR-SE. MAS DAI QUERER INVERTER AS COISAS, JA NAO É DEMOCRACIA. ENTAO AGORA QUEREM DIZER AOS MILHARES DE CRISTAOS ESPALHADOS BRASIL AFORA QUE SAO TODOS UNS IDIOTAS SEGUINDO COISAS QUESTIONAVEIS E ATE SURREAIS?AH VA...

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