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terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Lula: Por que o Brasil é o país das oportunidades


Por Luiz Inácio Lula da Silva

Passados cinco anos do início da crise global, o mundo ainda enfrenta suas consequências, mas já se prepara para um novo ciclo de crescimento. As atenções estão voltadas para mercados emergentes como o Brasil. Nosso modelo de desenvolvimento com inclusão social atraiu e continua atraindo investidores de toda parte. É hora de mostrar as grandes oportunidades que o país oferece, num quadro de estabilidade que poucos podem apresentar.

Nos últimos 11 anos, o Brasil deu um grande salto econômico e social. O PIB em dólares cresceu 4,4 vezes e supera US$ 2,2 trilhões. O comércio externo passou de US$ 108 bilhões para US$ 480 bilhões ao ano. O país tornou-se um dos cinco maiores destinos de investimento externo direto. Hoje somos grandes produtores de automóveis, máquinas agrícolas, celulose, alumínio, aviões; líderes mundiais em carnes, soja, café, açúcar, laranja e etanol.

Reduzimos a inflação, de 12,5% em 2002 para 5,9%, e continuamos trabalhando para trazê-la ao centro da meta. Há dez anos consecutivos a inflação está controlada nas margens estabelecidas, num ambiente de crescimento da economia, do consumo e do emprego. Reduzimos a dívida pública líquida praticamente à metade; de 60,4% do PIB para 33,8%. As despesas com pessoal, juros da dívida e financiamento da previdência caíram em relação ao PIB.

Colocamos os mais pobres no centro das políticas econômicas, dinamizando o mercado e reduzindo a desigualdade. Criamos 21 milhões de empregos; 36 milhões de pessoas saíram da extrema pobreza e 42 milhões alcançaram a classe média.

Quantos países conseguiram tanto, em tão pouco tempo, com democracia plena e instituições estáveis?
A novidade é que o Brasil deixou de ser um país vulnerável e tornou-se um competidor global. E isso incomoda; contraria interesses. Não é por outra razão que as contas do país e as ações do governo tornaram-se objeto de avaliações cada vez mais rigorosas e, em certos casos, claramente especulativas. Mas um país robusto não se intimida com as críticas; aprende com elas.

A dívida pública bruta, por exemplo, ganhou relevância nessas análises. Mas em quantos países a dívida bruta se mantém estável em relação ao PIB, com perfil adequado de vencimentos, como ocorre no Brasil? Desde 2008, o país fez superávit primário médio anual de 2,58%, o melhor desempenho entre as grandes economias. E o governo da presidenta Dilma Rousseff acaba de anunciar o esforço fiscal necessário para manter a trajetória de redução da dívida em 2014.

Acumulamos US$ 376 bilhões em reservas: dez vezes mais do que em 2002 e dez vezes maiores que a dívida de curto prazo. Que outro grande país, além da China, tem reservas superiores a 18 meses de importações? Diferentemente do passado, hoje o Brasil pode lidar com flutuações externas, ajustando o câmbio sem artifícios e sem turbulência. Esse ajuste, que é necessário, contribui para fortalecer nosso setor produtivo e vai melhorar o desempenho das contas externas.

O Brasil tem um sistema financeiro sólido e expandiu a oferta de crédito com medidas prudenciais para ampliar a segurança dos empréstimos e o universo de tomadores. Em 11 anos o crédito passou de R$ 380 bilhões para R$ 2,7 trilhões; ou seja, de 24% para 56,5% do PIB. Quantos países fizeram expansão dessa ordem reduzindo a inadimplência?

O investimento do setor público passou de 2,6% do PIB para 4,4%. A taxa de investimento no país cresceu em média 5,7% ao ano. Os depósitos em poupança crescem há 22 meses. É preciso fazer mais: simplificar e desburocratizar a estrutura fiscal, aumentar a competitividade da economia, continuar reduzindo aportes aos bancos públicos, aprofundar a inclusão social que está na base do crescimento. Mas não se pode duvidar de um país que fez tanto em apenas 11 anos.

Que país duplicou a safra e tornou-se uma das economias agrícolas mais modernas e dinâmicas do mundo? Que país duplicou sua produção de veículos? Que país reergueu do zero uma indústria naval que emprega 78 mil pessoas e já é a terceira maior do mundo?

Que país ampliou a capacidade instalada de eletricidade de 80 mil para 126 mil MW, e constrói três das maiores hidrelétricas do mundo? Levou eletricidade a 15 milhões de pessoas no campo? Contratou a construção de 3 milhões de moradias populares e já entregou a metade?

Qual o país no mundo, segundo a OCDE, que mais aumentou o investimento em educação? Que triplicou o orçamento federal do setor; ampliou e financiou o acesso ao ensino superior, com o Prouni, o FIES e as cotas, e duplicou para 7 milhões as matrículas nas universidades? Que levou 60 mil jovens a estudar nas melhores universidades do mundo? Abrimos mais escolas técnicas em 11 anos do que se fez em todo o Século XX. O Pronatec qualificou mais de 5 milhões de trabalhadores. Destinamos 75% dos royalties do petróleo para a educação.

E que país é apontado pela ONU e outros organismos internacionais como exemplo de combate à desigualdade?

O Brasil e outros países poderiam ter alcançado mais, não fossem os impactos da crise sobre o crédito, o câmbio e o comércio global, que se mantém estagnado. A recuperação dos Estados Unidos é uma excelente notícia, mas neste momento a economia mundial reflete a retirada dos estímulos do Fed. E, mesmo nessa conjuntura adversa, o Brasil está entre os oito países do G-20 que tiveram crescimento do PIB maior que 2% em 2013.

O mais notável é que, desde 2008, enquanto o mundo destruía 62 milhões de empregos, segundo a Organização Internacional do Trabalho, o Brasil criava 10,5 milhões de empregos. O desemprego é o menor da nossa história. Não vejo indicador mais robusto da saúde de uma economia.

Que país atravessou a pior crise de todos os tempos promovendo o pleno emprego e aumentando a renda da população?

Cometemos erros, naturalmente, mas a boa notícia é que os reconhecemos e trabalhamos para corrigi-los. O governo ouviu, por exemplo, as críticas ao modelo de concessões e o tornou mais equilibrado. Resultado: concedemos 4,2 mil quilômetros de rodovias com deságio muito acima do esperado. Houve sucesso nos leilões de petróleo, de seis aeroportos e de 2.100 quilômetros de linhas de transmissão de energia.

O Brasil tem um programa de logística de R$ 305 bilhões. A Petrobras investe US$ 236 bilhões para dobrar a produção até 2020, o que vai nos colocar entre os seis maiores produtores mundiais de petróleo. Quantos países oferecem oportunidades como estas?

A classe média brasileira, que consumiu R$ 1,17 trilhão em 2013, de acordo com a Serasa/Data Popular, continuará crescendo. Quantos países têm mercado consumidor em expansão tão vigorosa?

Recentemente estive com investidores globais no Conselho das Américas, em Nova Iorque, para mostrar como o Brasil se prepara para dar saltos ainda maiores na nova etapa da economia global. Voltei convencido de que eles têm uma visão objetiva do país e do nosso potencial, diferente de versões pessimistas. O povo brasileiro está construindo uma nova era – uma era de oportunidades. Quem continuar acreditando e investindo no Brasil vai ganhar ainda mais e vai crescer junto com o nosso país.


Luiz Inácio Lula da Silva é ex-presidente da República e presidente de honra do PT


Este artigo foi originalmente publicado no jornal Valor Econômico: http://www.valor.com.br/opiniao/3442426/por-que-o-brasil-e-o-pais-das-oportunidades

Via:http://wwwterrordonordeste.blogspot.com.br/

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

"A burguesia brasileira é selvagem, racista e escravista”, diz Lincoln Secco


Reprodução
Para o historiador Lincoln Secco, professor do Departamento de História da Universidade de São Paulo, a burguesia não aceita de fato a democracia. Só o discurso democrático

Antônio David
de São Paulo (SP),
especial para o Brasil de Fato

A classe média brasileira é extremamente corrupta. Essa é a avaliação do historiador Lincoln Secco, professor do Departamento de História da Universidade de São Paulo (USP) e autor do livro História do PT (Ateliê Editorial, 2011). Segundo ele, a disputa está agora no campo dos valores, aquele em que o PT deixou de atuar.

Nesta entrevista exclusiva ao Brasil de Fato, Lincoln Secco analisa, entre outras questões, o papel do Partido dos Trabalhadores (PT) e suas transformações. Para ele, as transformações materiais pelas quais o PT passou afetaram tanto as alas de esquerda quanto as de direita porque todas tiveram que se profissionalizar e aceitar que fazem parte do governo. “Não acredito mais que haja contestação da ordem no PT. Há de maneira individual ou em tendências minoritárias que não têm a mínima chance de ganhar a direção”.

Segundo ele, é preciso entender que Lula mudou a estrutura de classes no Brasil e ao mesmo tempo não atacou concretamente a herança de FHC, o qual mudou a composição patrimonial do capitalismo no Brasil. “Ao entender a nova dinâmica das classes, a esquerda poderia começar a organizar a nova classe trabalhadora. Se é que isso é possível agora”.

Brasil de Fato – Em seu livro História do PT, você afirma que o Partido dos Trabalhadores concorreu decisivamente para “civilizar” a sociedade civil, conquistando nela um espaço político para os trabalhadores, tornando as greves legítimas. Gostaria que você explicasse melhor essa ideia, trazendo-a para os dias atuais.
Lincoln Secco – Florestan Fernandes dizia que nós temos uma sociedade civil não civilizada. Falava em capitalismo selvagem (a expressão era dele) e que cabia ao movimento operário cavar um espaço para os subalternos na sociedade civil. A gente esquece que nos anos de 1980 os trabalhadores não podiam fazer greve. Faziam, mas era proibido. Não é que um juiz julgava a greve abusiva. O Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) simplesmente prendia todo mundo e cassava a direção do sindicato. É óbvio que a repressão continua de outra forma, mas o PT significou um polo antagônico dentro da sociedade civil. Os pobres também não podiam sequer ter certeza de comer no dia seguinte. Eu me lembro que era muito comum garotos de periferia terem só uma ou duas camisetas dadas por políticos. Na periferia não havia hipermercado e quase nunca se tomava iogurte que o pessoal só chamava de “danone”. As mulheres não compravam absorventes e não havia papel higiênico, só tiras de jornal pregadas na parede. Antigamente talvez fosse assim para quase todo mundo. Mas nos anos de 1980 a classe média já tinha tudo isso e os pobres não. O PT com todos os seus desvios continuou sua tarefa histórica ao realizar a diretriz de seu V Encontro de 1987: a criação de um mercado interno de massas.

Nesse mesmo livro, você utiliza com frequência a expressão "solo histórico" para afastar a ideia de que os limites do PT devam-se apenas à vontade ou à falta de vontade da direção do partido. Novamente, gostaria de pedir que você explique essa ideia.
O PT emergiu num momento em que o Brasil vivia dois processos internos determinantes: a crise econômica e política da Ditadura. Com isso, mascaravam-se mudanças externas que só aportariam mais tarde no Brasil sob a forma do neoliberalismo. Este “atraso” permitiu aquilo que eu chamo de Revolução Democrática que se deu entre 1984 e 1989. A “revolução” não venceu, mas nos deu um arcabouço constitucional progressista e um partido socialista de massas. Vivíamos um longo ciclo internacional recessivo desde os anos 70. O PT foi um ponto fora da curva. Não surgiu nada como ele em outros países latino-americanos. Quando este partido se estabelece como alternativa de poder, eis que o vendaval do neoliberalismo arrasa os sindicatos, destrói os empregos e joga o PT no canto do ring. Estávamos numa conjuntura de derrota política do neoliberalismo que podia ser aproveitada de maneira mais radical, o partido tinha se popularizado, mas ao mesmo tempo o partido tinha se profissionalizado e incorporado valores dos seus adversários. O neoliberalismo persistia na esfera dos valores. Neste contexto é difícil dosar o quanto transformações estruturais do partido e da sociedade e opções conscientes dos dirigentes responderam pela moderação do PT. Prefiro dizer que não dava para fazer muito desde 2003. Mas dava para fazer mais.

Em Os sentidos do lulismo, o cientista político André Singer sustenta que no PT ainda coexistiriam “duas almas”: ao lado da alma da aceitação da ordem, coexistiria a alma da contestação dessa mesma ordem. Você concorda com essa imagem
É uma boa escolha estilística. Mas não acredito mais que haja contestação da ordem no PT. Há de maneira individual ou em tendências minoritárias que não têm a mínima chance de ganhar a direção. O problema não é esse. Não acredito que o PT trocou sua alma. Ele passou por um aggiornamento gradual como um todo. Isso se deveu às escolhas que ele fez em 2002 e ao “solo histórico”, como já conversamos aqui. As transformações materiais pelas quais o PT passou afetaram tanto as alas de esquerda quanto as de direita porque todas tiveram que se profissionalizar e aceitar que fazem parte do governo. O que não quer dizer que as alas e as pessoas sejam iguais em suas crenças, compromissos ideológicos e esperanças, é óbvio.

André Singer argumenta também que o PT teria adquirido "características que lembram as do PTB anterior a 1964". Você concorda com essa comparação?
Se pensarmos em termos da “função” do PTB no “sistema” político da época, talvez o paralelo seja correto. Ao longo do tempo ele atingiu os votos dos pobres urbanos e teve dificuldade de se implantar em São Paulo onde disputou com o voto popular conservador de Ademar, Jânio etc. Só que o PTB foi criado de cima para baixo por um ex-ditador enquanto o PT foi autenticamente popular. Os analfabetos não votavam, a instabilidade político-militar era muito maior, as pressões golpistas dos Estados Unidos eram explícitas e a Constituição de 1946 era muito mais conservadora do que a atual. São ambientes totalmente distintos. O que dá para pensar é em algumas permanências daquele ambiente político, sem esquecer que tivemos uma Ditadura Militar no meio que destruiu a vida política e cultural do Brasil.

Em seu livro, ao abordar as transformações sofridas pelo PT, você indaga: “Mas é melhor manter os princípios e nunca chegar ao governo e não fazer mudanças favoráveis aos mais pobres? Chegar assim ao poder muda essencialmente a sorte dos de baixo?”. Com base nessas questões, como você avalia o debate na esquerda sobre a experiência dos governos Lula e Dilma?
Se você se refere aos pequenos partidos críticos do PT, eles não permaneceram pequenos porque seus objetivos programáticos estão errados. A crítica deles às insuficiências do governo e até aos desmandos brutais e alianças corrompidas é correta. Mas eles têm uma cegueira ideológica que impede avaliar a conjuntura. Não quero dizer que algum gênio avaliaria corretamente, mas uma direção partidária deveria fazê-lo. O primeiro passo é entender que Lula mudou a estrutura de classes no Brasil e ao mesmo tempo não atacou concretamente a herança de FHC, o qual mudou a composição patrimonial do capitalismo no Brasil. Mas qual esquerda discute isso? Por incrível que pareça setores internos do PT promovem este debate. O livro do André Singer contribuiu muito. A Fundação Perseu Abramo do PT também. Ao entender a nova dinâmica das classes, a esquerda poderia começar a organizar a nova classe trabalhadora. Se é que isso é possível agora.

Pouco tempo depois do escândalo do “mensalão” ter estourado, ocorreram eleições internas no PT. Em seu livro, ao abordar as eleições no PT ocorridas em 2005, você afirma: “a militância do PT salvou o partido”. Por quê?
Naquele momento a militância tradicional já estava afastada. Ela se mantinha como uma torcida na arquibancada. Não tinha mais pretensões de jogar. A crise de 2005 reacendeu por um átimo a chama da velha militância petista e ela foi silenciosa, mas corajosamente defendeu o PT. Organizações como o MST e a UNE foram importantes, mas os militantes anônimos é que foram ao PED (processo de eleição direta) quando a imprensa vaticinava baixo comparecimento e o fim do partido. O PED fez com que os setores da oposição que desejavam a derrubada de Lula percebessem que o custo político seria alto demais. Derrotar assim um partido de massas e um presidente com a história do Lula mantendo a fachada democrática seria impossível. É claro que setores da burguesia não estavam incomodados com o governo e não desejavam (como nunca desejam) crises políticas que afetem os negócios. Mas aquela era uma crise eminentemente política e as decisões foram tomadas em função da relação entre o custo político do impeachment e a esperança de vitória da oposição em 2006.

Na sua opinião, qual é o significado político das campanhas de doação financeira para o pagamento das multas de José Genoíno e Delúbio Soares? Aqui também se pode dizer que a militância salvou o partido?

Neste caso, eu acho que a militância não salvou o partido porque se ele quer ser salvo de alguma coisa é da própria lembrança do chamado mensalão. Ela talvez tenha sido incômoda para os dirigentes atuais porque os impede de esquecer seus antigos líderes que estão presos.

Ainda com relação ao escândalo do "mensalão", em seu livro você critica a passividade da direção do PT, que, na sua opinião, não politizou a crise. Por que a direção petista deveria ter politizado a crise e como você avalia a postura da direção do PT agora, pós-julgamento?

Esta é uma questão que precisa ser situada em três tempos. Na crise de 2005 era possível politizar e confrontar. Havia risco? Sempre há. Mas o PT teria saído com mais força ainda para fazer reformas profundas no II mandato. O PT não quis politizar a crise e deixou a iniciativa para a oposição. Ela continua politizando o “mensalão” até hoje. O segundo tempo foi o do julgamento, calculado para atrapalhar as pretensões eleitorais do PT. Naquele momento as perspectivas de politização eram menores e a tática do avestruz empregada por Lula “já tinha dado certo”. Afinal, o PT foi o grande vitorioso nas duas ultimas eleições (2010 e 2012). Agora estamos no terceiro tempo: os réus já estão condenados e presos. Não há mais nada a ser feito. Eles só serão soltos quando cumprirem parte de sua pena e politicamente já estão fora do jogo. E exatamente nesta etapa é que a direção do partido deu o maior número de declarações contra o julgamento. Ainda foi uma reação tímida. Mas a militância do PT aprendeu que o “mensalão” não interfere no resultado eleitoral e foi além de sua direção na solidariedade aos condenados.

Quais são as implicações políticas do julgamento do “mensalão” e da prisão de dirigentes do PT?
Este já é um assunto da história do PT. Não tem mais a mínima importância para os dirigentes atuais, salvo o constrangimento de ter que dar satisfações eventuais aos militantes. É óbvio que se pudessem escolher, eles prefeririam ver José Dirceu absolvido. Não é disso que se trata. A hora da reação já passou há muito. Exceto se houvesse uma improvável radicalização do governo num possível terceiro mandato, a crise de 2005 poderia ser reavaliada. Hoje o fato é este: o PT foi derrotado politicamente, apesar de suas vitórias eleitorais. Em nenhum partido social democrata do planeta seria normal aceitar a prisão de dois ex-presidentes do partido num julgamento totalmente político. Nem vou discutir o mérito das acusações. O julgamento é político porque as inovações que ele comporta foram casuísticas e só valeram para o PT. Juristas conservadores se assustaram com os vícios formais e o desrespeito à lei.

Como você avalia o resultado do último PED, que consagrou Ruy Falcão como presidente do PT com uma votação superior a 70% dos votos?
Eu poderia explicar o número com exemplos que ouvi dentro do PT, mas prefiro não enveredar pelo caminho das denúncias de filiações em massa e falsificação de votos. Não que isso não seja importante. Mas sempre aconteceu no PT em alguma medida. Há dois aspectos da vitória de Ruy Falcão por ampla margem. O primeiro deriva da profissionalização da militância e do uso de recursos financeiros. Mas o segundo tem a ver com o apoio incondicional que a nova base de filiados ao PT dá de fato ao governismo.

Na sua opinião, que implicações as manifestações de junho tiveram do ponto de vista da correlação de forças na sociedade? O PT e o governo Dilma souberam aproveitar a energia das ruas?
Junho iniciou um novo ciclo político no Brasil. Novíssimos movimentos sociais assumiram mais legitimidade popular do que os partidos tradicionais e estes terão que mudar. O governo ficou acuado juntamente com todo o sistema político. Mas Dilma foi quem ofereceu a resposta mais avançada: a reforma política. Mas o problema não está no conteúdo da reforma, rapidamente rechaçado por todos os partidos. Está na forma. Por que os políticos aceitariam reformar-se? E por que ela resolveu se dirigir a eles? Acredito que ela quis dar uma satisfação às ruas sem se comprometer realmente com a reforma. Ou seja, ela não esperava nada de sua proposta. Caso contrário teria se dirigido às ruas. Só que um governo de coalizão com partidos conservadores como o dela não pode fazer isso.

Como você encara a declaração do ex-presidente Lula, em seu artigo no New York Times publicado logo após as manifestações, de que o PT "precisa renovar-se profundamente"?
Ele também foi o que dentro do PT deu declarações mais favoráveis aos protestos de junho. Mas prefiro não comentar.

Você é um dos autores do livro Cidades Rebeldes. Em seu artigo, você afirma que o MPL, organização horizontal e autonomista, mas dirigente, foi o ator mais importante na primeira fase dos protestos [de junho]. Na sua opinião, que papel o MPL poderá cumprir na conjuntura política do país?
A geração que saiu às ruas certamente vai fornecer no futuro os melhores quadros de esquerda do Brasil. Neste caso, não me refiro ao MPL apenas, embora os seus jovens membros tenham uma qualidade de leitura da conjuntura e uma capacidade de luta que muitos partidos de esquerda não têm. Eu admiro os que eu conheci na USP. É possível que o MPL continue sendo o principal atrativo para manifestações legitimadas por amplos segmentos sociais. Mas mesmo que o MPL não seja essa força principal, o conjunto dos novíssimos movimentos sociais vai cumprir este papel. Eles vão continuar demonstrando que há insatisfação na sociedade.

Qual é a sua opinião sobre os Black Blocs?
Trata-se de uma tática. Depende do momento já que a tática é a arte de operar com os meios que você tem no “campo de batalha”. Alguém pode condenar um mascarado que se protege da espionagem policial e de suas prisões arbitrárias O problema desde junho de 2013 não está na destreza tática dos jovens. Isso eles têm de sobra. Está na ausência de uma estratégia política. Ou seja, na arte de conduzir inúmeras batalhas para vencer a “guerra”.

Há poucos dias você publicou um artigo no qual fala dos riscos da “democracia racionada”, e que estaríamos diante de um dilema: “mais democracia ou mais um passo para trás”. Por quê?
Porque essa é a nossa tradição histórica. A burguesia brasileira é selvagem, racista e escravista. Ela não aceita de fato a democracia. Só o discurso democrático. É mais ou menos como aquela burguesia paulista que em 9 de julho de 1932 se mobilizou pela democracia e dois dias antes prendeu todos os comunistas e anarquistas. A democracia racionada é basicamente assim: quando se abandona uma ditadura aberta, permite-se que os direitos políticos avancem, mas não os sociais. Mas isso é impossível, por isso também os direitos sociais avançam. Diante disso, a política recua. O que há de novo em nossa época é o uso ostensivo do poder judiciário para barrar os avanços sociais sem afetar a fachada democrática.

Num artigo publicado recentemente, você fala do “direito à violência”, e argumenta: “o isolamento a que estão sendo condenados os novíssimos movimentos sociais é produto da recusa da contraviolência legítima”. Por quê?
É que há um consenso proveniente da Ditadura: manifestantes devem apanhar calados. Ora, se há uma polícia militar que é uma criação da Ditadura, acostumada a violar seus direitos, por que você não pode se defender? Nem sou tão radical quanto às constituições originais da burguesia europeia ou dos EUA que admitiam o direito do povo de derrubar seus governos ilegítimos. O Brasil está longe da democracia burguesa. Também não me refiro à luta armada e sim ao conservantismo da imprensa que acusa manifestantes de portar vinagre e estilingue.

Passados mais de dez anos da eleição de Lula, como você encara a disputa ideológica na sociedade? Quem está ganhando a disputa de “corações e mentes”?
É cedo para dizer. O melhor é que os novíssimos movimentos sociais despertassem uma nova consciência crítica. Já a aposta da classe média tradicional pode ser a de uma falsa terceira via (Campos e Marina). Ela aceitaria as políticas sociais de Lula e romperia com o PT, o suposto responsável pela violação dos princípios da classe média: eficiência do Estado, ética etc. Tudo mentira, é claro. A classe média brasileira é extremamente corrupta. Já o PSDB ainda não aprendeu com aquele artigo de FHC sobre o papel da oposição. A disputa está agora no campo dos valores, aquele em que o PT deixou de atuar.

Como você avalia o primeiro ano do governo de Fernando Haddad em São Paulo?
Regular. Teve o imprevisível: as manifestações de junho. Não soube lidar com elas. Depois, avaliou mal (como todo o PT) o novo aspecto da dominação burguesa no Brasil que deslocou sua hegemonia do discurso do mercado para o judiciário. Foi assim que um IPTU garantido pela Câmara Municipal foi derrotado. A comunicação é ruim porque o prefeito não consegue sequer explicar as coisas boas que fez, como novos corredores de ônibus. E como bom petista, o prefeito não vai radicalizar.

Por fim, gostaria de perguntar que balanço você faz da gestão Rodas (2010-2013) na Universidade de São Paulo.
Ele foi uma figura singular num período especial da história da USP. Hoje ela é uma universidade com forte discurso neoliberal. Mas Rodas trazia práticas da ditadura Militar, à qual ele servira. Ao mesmo tempo surfou na onda de aumento da arrecadação do ICMS. Ele foi uma espécie de Maluf da reitoria, ou seja, alguém com apoio “popular” conservador. Fez e desfez obras sem se preocupar com os gastos e distribuiu dinheiro sem aumentar salários convenientemente, através de prêmios, cartões de refeição e bolsas.

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Nova Palestina, a incrível cidade dos sem-teto


Casas de madeirite. Grupos de trabalho, mutirões e assembleias. Como lutam e vivem 30 mil pessoas que ocuparam terreno gigante em S.Paulo



Reportagem de Isabel Harari e Roberto Oliveira, da Agência Vaidapé | Fotos: Victor Santos

Clodoaldo Santos Costa acorda todos os dias às 7h e sai para buscar água para a cozinha coletiva do G3, maior grupo, com mais de mil barracos, da ocupação Vila Nova Palestina. Sem isso, não há café da manhã. Quando ele volta com o primeiro dos quase 20 galões que carrega às costas todo dia, as cozinheiras já o esperam, limpando e organizando o refeitório, prontas para colocar a água no fogo e preparar o café que, com bolachas e o pão com manteiga doado por um padeiro da vizinhança, ajudam a acordar e sustentar os trabalhadores que saem à labuta diária.

“Aqui se aprende a lutar por nós e pelos outros também”, afirma Clodoaldo, que há mais de dez anos vive de aluguel e aprendeu com seu cunhado que é possível conquistar a casa própria através dos movimentos sociais. “Aqui não tem vitória sem luta”, ele garante. Clodoaldo deixou mulher e filhos para viver na ocupação, em busca da casa própria. Com frequência, a família o visita e participa das atividades do acampamento.

Enquanto isso, nos demais setores da ocupação, a cena se repete – os galões de água se amontoando ao lado das cozinhas. Pois além do café tem a louça e as demais refeições do dia, que está só começando na Nova Palestina. Antes de partirem para trabalhar ou estudar (há muitas crianças em todos os grupos da ocupação), os moradores assinam a lista de presença diária – método utilizado pelo MTST para controlar a frequência em suas ocupações.

Porém, muita gente permanece na Nova Palestina. Porque não faltam tarefas e atividades cotidianas na pequena cidade. Quem fica na ocupação dá conta dos chamados mutirões: de limpeza, infraestrutura, água, segurança, alimentação. Tudo funciona coletivamente, através de setoriais que cumprem diferentes papéis no acampamento. “Fazemos tudo aqui por mutirão, hoje [5/2] vamos fazer a troca da rede elétrica da ocupação”, diz Dorgival Duarte, do G5, que morava de aluguel no Jardim São Luiz, zona sul, até que o proprietário decidiu vender o imóvel e ele ficou desabrigado. Ele explica que não é permitido ter pontos de luz nos barracos dos acampados, pelo perigo de causar incêndios nas lonas de plástico. Assim, foram construídas verdadeiras ruas e avenidas na Nova Palestina, margeadas por postes de luz.



Além da água que cada setor tem que se organizar para buscar pela manhã, há tarefas como a manutenção das lonas e madeirites e a coleta do lixo – que os moradores levam para a rua Clamecy, ao lado do barranco em que se construiu a Nova Palestina, para que haja a coleta pelo caminhão da Prefeitura uma vez por semana. Fato que implica num cheiro forte na entrada do terreno e, pior, na multiplicação dos riscos para a saúde dos acampados. Apesar da coordenação da ocupação ter requerido à administração municipal uma caçamba de lixo para que esta situação seja amenizada, o pedido ainda não foi atendido.

Meio-dia. O sol forte está a pino sobre a Nova Palestina quando se ouve gritos por toda parte: “Olha o almoço no G3″; “saindo almoço no G5″; “olha o rango no G20″. E as pessoas, escondidas debaixo de alguma réstia de sombra, começam a aparecer, uma a uma, em suas respectivas cozinhas coletivas. As filas vão se formando no momento mais aguardado desde o café da manhã. O almoço quase sempre é composto por feijão, arroz, legumes, como batata ou cenoura, e um pedaço de carne – vermelha ou branca, como as tilápias que os acampados pescam com rede no açude que fica a poucos metros em declive no fundo do terreno.

Se possível, há ainda um copo de refrigerante para cada pessoa; quando não, a água gelada mata a sede e o calor do mesmo jeito. Os mantimentos e utensílios são doados pelos próprios moradores ou por pessoas solidárias ao movimento. Às vezes, também há doações de mercados e centros de distribuição de alimentos. Aos poucos, o amontoado de pessoas dá lugar a uma pilha de pratos e talheres sujos, e o silêncio vai tomando conta de cada grupo da ocupação, como numa sesta coletiva.

O silêncio se rompe, porém, com o corre-corre das crianças – umas chegando, outras saindo para a escola. E muitas brincando, de pega-pega, futebol, pular corda, no terrão descampado no centro do terreno da ocupação. “Nós estamos construindo uma brinquedoteca para as crianças aqui no G5, para elas não ficarem debaixo do sol forte e terem um lugar pra brincar”, diz Edilaine Ferreira, uma das coordenadoras do Grupo 5 da ocupação, que morava de favor do Jardim Aracati, quando o proprietário pediu de volta o terreno e ela ficou sem um teto. Edilaine tem quatro filhos e conta que uma das maiores dificuldades na Nova Palestina é conseguir matricular as crianças em escolas públicas.

Vídeo por João Miranda e Vinícius Pereira

Em sua maioria, elas permanecem nos colégios que estudavam antes da ocupação: o Jardim Aracati, Jardim dos Reis e Capela IV, a cerca de 30, 40 minutos do acampamento. Não é possível realizar a matrícula em escolas mais próximas à Nova Palestina, pois os acampados não possuem comprovante de residência. Só nesse grupo, são em torno de 250 crianças.

Quem também ajuda a coordenar o G5 é “Dona Mônica”, como é respeitosamente chamada. Ela está no acampamento “desde as 11h45 do dia 29 de novembro do ano passado”, quando o Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST) ocupou o terreno de quase 1 milhão de metros quadrados ao lado da rua Clamecy, numa perpendicular da estrada do M’boi Mirim, sentido represa do Guarapiranga, na região do Jardim Ângela.

A Vila Nova Palestina, conforme batismo na primeira assembleia, conta hoje com oito mil famílias, cerca de 30 mil pessoas e é dividida em 21 grupos, os conhecidos “gês”. Cada grupo tem uma média de cinco coordenadores, que ajudam a organizar as tarefas do cotidiano: fazer a lista de presença, a coleta do lixo, a busca d’água, a manutenção da infraestrutura, mobilizar as pessoas para as assembleias e, principalmente, resolver os conflitos existentes em toda família – normalmente briga de casais e desavenças entre crianças. “A gente encontra aqui uma nova família e vive a realidade de outras pessoas. Às vezes pensamos que nosso sofrimento é maior que o dos outros, mas sempre tem gente sofrendo mais que a gente”, diz ela, explicando que a ocupação é uma grande escola de vida.

O MTST reivindica que a prefeitura revogue o Decreto de Interesse Social lançado na gestão Kassab, que determina a construção de um parque na região e assegura apenas 10% de área edificada. Jussara Basso, militante do MTST, aponta para o Parque Ecológico do Guarapiranga, distante apenas 50 metros da ocupação, fato que evidencia a arbitrariedade da medida. A luta é pela mudança do tipo de zoneamento para uma ZEIS-4 (Zona Especial de Interesse Social 4), em que 30% da área possa ser habitada.



Os proprietários do terreno, Nelson Luz Roschel e Roberto Roschel afirmaram em nota no dia 13 de janeiro que concordam em dialogar com o movimento e entregar o terreno para os moradores caso a Prefeitura mude o zoneamento. A secretaria de Direitos Humanos preparava-se para realizar uma primeira reunião com os movimentos de luta por moradia na quinta-feira, dia 13 de fevereiro.

Assim como possuir pontos de luz nos barracos, também é proibido construí-los em alvenaria, pois o objetivo da ocupação é conquistar moradia digna para todas as pessoas, e não se transformar em mais uma favela de São Paulo. Assim, na Nova Palestina as construções são de madeirite. “A ideia não é permanecer dessa forma. Não sabemos quanto tempo vamos ficar aqui, pode ser até o Plano Diretor ser votado, ou daqui a seis meses, é uma incerteza…”, aponta Jussara.

Além disso, também não é permitido o consumo de drogas na ocupação, à exceção do cigarro e de “uma cervejinha ou outra no final de semana”. A água, por sua vez, é levada através de uma mangueira às cozinhas coletivas até o G8, mas já há um plano de extensão do sistema até o G16. Enquanto isso não acontece, os moradores dos demais grupos vão buscando galões dia após dia para satisfazer tanto as necessidades individuais como coletivas de seus respectivos grupos.

Do ponto de vista cultural, acontecem algumas atividades para integração e diversão dos moradores da pequena cidade. De vez em quando, bingos e gincanas são organizados e a rádio, que fica em frente ao terrão onde são realizadas as assembleias, está sempre ligada, tocando música e disponível para divulgar qualquer informação que transcenda os grupos.

As assembleias, aliás, costumavam acontecer todo dia. Mas agora são realizadas em dias intercalados, sempre às 19h, quando a grande maioria dos moradores empregados chega do trabalho. Nelas, discute-se o cotidiano da Nova Palestina e questões políticas, como atos e reuniões de negociação, por exemplo, e também é passada uma lista de presença – que se soma à lista do dia a dia e à dos protestos para controlar a frequência dos acampados nas atividades da Nova Palestina. Segundo o MTST, quanto maior a presença das pessoas no conjunto de atividades, melhor a colocação delas nas listas para conseguir moradia via programas habitacionais, como o Minha Casa, Minha Vida, do Governo Federal, ou o CDHU, estadual.

Após a assembleia, o jantar é servido às 20h. Depois de se alimentarem, os moradores assistem TV ou conversam em pequenas rodas. Então, começa a última atividade do dia (e uma das mais importantes): a trilha, uma espécie de ronda no acampamento para garantir a segurança dos moradores durante a noite. “A gente não é polícia, só organizamos as trilhas para garantir tranquilidade das pessoas dormirem”, afirma Dorgival, que faz parte da setorial de autodefesa. Segundo ele, cerca de 40, 50 pessoas se dividem em trilhas que vagam, umas, nos grupos e, outras, em toda a ocupação – sempre divididos em quatro ou cinco pessoas.

Além de Dorgival, muitas outras pessoas que passam o dia no acampamento se dispõem a fazer as trilhas. Entre elas, está Clodoaldo Santos Costa, coordenador do G3 que, após longas caminhadas, vai dormir às 3h. Afinal, às 7h ele precisa estar em pé – vai buscar galões de água para fazer o café, que sustentará os moradores da Vila Nova Palestina em mais um dia de luta, dentro e fora da ocupação.

sábado, 15 de fevereiro de 2014

Paulo Henrique Amorim responde a editorial da Rede Globo “vestido” de black bloc



Via:http://wwwterrordonordeste.blogspot.com.br/

A democracia e a liberdade de expressão estão em risco

A frase tem sido repetida à exaustão nas manchetes de jornais, em meio à enorme comoção causada pela trágica morte do cinegrafista da Band Santiago Ilídio Andrade, atingido por um rojão no dia 06 de fevereiro de 2014, enquanto cobria uma manifestação no centro do Rio de Janeiro contra o aumento das passagens de ônibus. A violência no contexto das manifestações não é de hoje.

Desde junho de 2013, foram ao menos 118 agressões a jornalistas em todo o Brasil, a maioria delas cometidas pela polícia. O número de manifestantes atingidos gravemente por balas de borracha e estilhaços de bombas “de efeito moral” é incontável e expressa a força estatal da repressão militarizada. Essa violência institucional que vem sendo acionada para coibir as manifestações também produziu vítimas fatais: contabilizam-se ao menos 18 mortes em todo o Brasil, incluídas neste número as execuções de 9 moradores da Maré durante uma operação da PMERJ, com apoio da Força Nacional de Segurança, no dia 24 de junho, a partir da justificativa de “buscar suspeitos” de terem realizado um arrastão durante uma manifestação em Bonsucesso.

A democracia e a liberdade de expressão estão em risco quando assistimos a um sinistro avanço de medidas de repressão extrema às lutas sociais no Brasil: prisões para averiguação, detenção pelo crime de desacato, flagrantes forjados, violação do segredo nas comunicações e espionagem por meio de redes sociais, sigilo nas investigações policiais e falta de acesso à informação sobre os trâmites dos processos. Adiciona-se a essa lista o uso de legislações que remetem ao período de exceção – como a lei de segurança nacional (antes aplicada para punir quem lutava contra a ditadura civil-militar) e o projeto de lei 499 de 2013 que tramita no Senado e tipifica o crime de terrorismo.

A democracia e a liberdade de expressão estão em risco quando mais uma vez se atualiza a tentativa de deslegitimar e criminalizar os movimentos sociais e a indignação popular. A luta pelos direitos humanos fortalece a democracia . É inaceitável a morte de Santiago e também a perseguição e ameaça àqueles que atuam para assegurar o direito de defesa de todo e qualquer manifestante.
A democracia e a liberdade de expressão estão em risco quando mortes são usadas politicamente para manipular a opinião pública, abafar as pautas das manifestações e atacar defensores de direitos humanos de forma extremamente irresponsável. O problema a ser enfrentado é e sempre foi justamente o oposto: as violações a esses direitos.

Assinam essa nota:
Organizações
Apafunk – Associação dos Profissionais e Amigos do Funk
Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais no Estado da Bahia – AATR
Associação Homens e Mulheres do Mar da Baía de Guanabara – AHOMAR
Associação Nacional de Ação Indigenista – ANAI
Associação Pela Reforma Prisional – ARP
Campanha Reaja ou Será Morta, Reaja ou Será Morto/BA
Casa da Mulher Trabalhadora – CAMTRA
CEDECA Rio De Janeiro
Centro de Direitos Humanos Dom Oscar Romero – CEDHOR
Centro de Convivência É de Lei – Redução de Danos/São Paulo
Centro de Teatro do Oprimido – CTO/RJ
Coletivo Das Lutas
Comitê Latino-americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher – CLADEM
Comitê pela Desmilitarização da Policia e da Política
Comunicadores Populares RJ
CONECTAS
Conselho Regional de Psicologia/RJ
Cultura Verde – coletivo antiproibicionista e antimanicomial
Dignitatis
Diretoria da Adunirio – SS do ANDES – Sn
Equipe Clínico-Política RJ
Federação das Associações de Favelas do Estado do Rio de Janeiro – FAFERJ
Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional – FASE
Fórum de Reparação e Memória do Rio de Janeiro
Fórum de Saúde do Rio de Janeiro
Fórum Social de Manguinhos
Frente Estadual Drogas e Direitos Humanos – RJ
Geledés – Instituto da Mulher Negra
Grupo Tortura Nunca Mais/RJ
Ibase
Instituto Búzios
Instituto de Defensores de Direitos Humanos (DDH)
Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul – PACS
Instituto Práxis de Direitos Humanos
Instituto Terra Trabalho e Cidadania (ITTC)
Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social
ISER
Justiça Global
Laboratório de Análise da Violência da UERJ
Movimento Mães de Maio
Movimento Nacional de Luta por Moradia
Movimento pela Legalização da Maconha
Núcleo de Direitos Humanos do Departamento de Direito da PUC-Rio
Pastoral Carcerária Nacional
Quilombo Xis-Ação Cultural Comunitária
Rede de Comunidades e Movimentos contra a Violência – RJ
Rede Nacional de Adolescentes e Jovens Comunicadorxs – Renajoc
Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares – RENAP
Sociedade Maranhense de Direitos Humanos
Tribunal Popular
Viração Educomunicação
Visão da Favela Brasil
Indivíduos
Abrahão de Oliveira Santos – Professor de Psicologia da UFF
Adriana Britto – Defensora Pública e Articuladora do Fórum Justiça
Alexandre Anderson – AHOMAR
Ana Maria Bezerra Galdeano – Agente comunitária de saúde
Bruno Marinoni – Jornalista
Bruno Ramos Gomes – Psicólogo, coordenador do Centro de Convivência É de Lei
Cecília Coimbra – Professora da Universidade Federal Fluminense e fundadora do GTNM/RJ
Celi Cavallari – Psicóloga, psicanalista, conselheira da REDUC (Rede Brasileira de Redução De Danos) e membro da ABRAMD (Associação Brasileira Multidisciplinar de Estudos sobre Drogas)
Charles Toniolo de Sousa – Professor da Escola de Serviço Social da UFRJ/Presidente do Conselho Regional de Serviço Social (CRESS-RJ) entre 2011 e 2013
Christiane dos Passos Guimarães – CRES
Claudio Gomes Ribeiro
Danichi Hausen Mizoguchi – Professor de Psicologia da Universidade Federal Fluminense
Daniela Albrecht – Núcleo Estadual do Movimento da Luta Antimanicomial do RJ e Fórum de Saúde do RJ
Danielle Vallim – Socióloga. Doutoranda visitante da Universidade de Columbia
Débora Rodrigues – Assistente social
Diogo Justino – Advogado, mestre e doutorando em Teoria e Filosofia do Direito (UERJ) e professor da Universidade Cândido Mendes
Eduardo Baker – Advogado
Eduardo Passos – Professor de Psicologia da UFF
Fernanda Pradal – Advogada
Fernando Delgado – Advogado
Flávia Fernando Lima Silva – Psiquiatra
Geandro Ferreira Pinheiro – EPSJV/Fiocruz
Geo Britto – Ator e sociólogo
Heliana Conde – Professora de Psicologia na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)
Helen Sarapeck – CTO/RJ
Ignácio Cano – Professor da UERJ
Janne Calhau – Psicóloga institucional
Julia Bustamante – Diretora do DCE da UFRJ
Julia Horta Nasser – Psicóloga, membro do Fórum de População Adulta em Situação de Rua
Leonardo Vidal Mattar – Membro do Fórum de Saúde/RJ
Luís Fernando Tófoli – Psiquiatra, professor da UNICAMP
Marcos Arruda – Educador
Maria Gorete Marques de Jesus – Socióloga e pesquisadora
Maria Rosário de Carvalho – Antropóloga
Maria Virgínia Botelho
Maurício Renault de Barros Correia – Membro da Frente Estadual Drogas e Direitos Humanos/RJ
Monique Ribeiro Alves – Assistente social e membro do Fórum de Saúde/RJ
Moniza Rizzini – Advogada
Patricia Birman – Professora da UERJ
Paulo César de C. Ribeiro – Diretor da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio – Fiocruz
Renato Roseno – Advogado
Repper Fiell
Rita de Cássia Santos Fortes – Assistente social
Roberto Leher – UFRJ
Rodolfo Valente – Advogado
Rodrigo Mattei – Membro do Cultura Verde, da Frente Estadual Drogas e Direitos Humanos/RJ, do Planta na Mente e do DCE-UFRJ
Rogério Alimandro – PSOL/RJ
Rosane M. Reis Lavigne – Defensora Pública e Articuladora do Fórum Justiça
Sandra Lucia Goulart, antropóloga, Doutora em Ciências Sociais pela Unicamp, Professora da Faculdade Cásper Líbero
Sandra Quintela – Economista
Silvia Dabdab Calache Distler – Assistente social
Taiguara L. S. e Souza – Professor de Direito Penal
Tânia Kolker
Taniele Rui – Pós-doutoranda do Social Science Research Council
Tiago Joffily – Promotor de Justiça – RJ
Tiago Régis – Psicólogo, doutorando no Programa de Pós-Graduação de Psicologia da UFF
Vera Malaguti Batista – Instituto Carioca de Criminologia
Vera Vital Brasil – Psicóloga

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Quem é ele que se vestia com a mesma roupa do Caio e que está ao lado da polícia?

Renato Rovai, / Blog do Rovai


"O melhor é assistir esse vídeo inteiro, mas se não tiver tempo, vá até o minuto 3:48 e siga ao menos até os 3:55. Antes disso fica claro que as cenas são do exato momento em que o cinegrafista, da Band, Santiago Andrade é atingido pelo rojão que acaba levando-o a morte. Há muitas circulando na rede a partir da divulgação desse vídeo. Veja o vídeo antes e depois leia as considerações abaixo dele.


1) Esse manifestante tem as roupas com as mesmas características que o acusado de jogar o rojão utilizava. E estava tão suado quanto o que apareceu no vídeo inicial.

2) Ao mesmo tempo apareceu hoje uma foto de Caio Silvo de Souza, que foi preso hoje pela manhã, em Feira de Santana, Bahia, brigando na catraca da estação da Central do Brasil naquele dia do conflito. E as fotos comprovam que ele também usava calça jeans e camisa cinza. Ao mesmo tempo surgiu essa montagem que pode ser apenas uma montagem diversionista (mas que também pode ser séria) onde ele não usa relógio na foto da Central e que estaria com relógio no momento em que é flagrado pelo vídeo que o levou a prisão.


Há ainda uma outra série de perguntas que estão sendo realizadas na rede.

3) Por que o advogado que está defendendo Caio é o mesmo que defende Fábio Raposo, que também foi preso por lhe entregar o rojão?

4) Qual a relação desse advogado, Jonas Tadeu Nunes, com as milícias do Rio de Janeiro?

5) Por que a primeira declaração que o advogado deu foi tentando levar Marcelo Freixo para dentro da história?

6) Por que ele antes mesmo de conversar por mais tempo com o seus clientes já saiu dizendo que eles recebiam dinheiro de partidos para participar das manifestações, mas não revelou quem os pagava? A quem essa narrativa interessa?

7) Por que o advogado Jonas Tadeu está usando uma estratégia tão arriscada para os seus clientes?

Há outras perguntas a serem feitas e este blogue não está afirmando nada.
Uma pergunta que é quase um xeque mate em todas as outras é:

8) Por que Caio assumiria um crime que não cometeu?

Essa é uma pergunta importante, mas que na opinião deste blogueiro não invalida todas as outras.

Se essas questões não forem respondidas rapidamente, vai se criar um clima de suspeita sobre as investigações. Até porque a polícia do Rio já foi flagrada mais de uma vez armando cenas contra manifestantes e utilizando P2 para isso. Até o Jornal o Globo já deu flagrante neles. Mas segue um vídeo da Mídia Ninja mostrando a farsa de forma clara."



Boechat e a Band também precisam pedir perdão à família de Santiago Andrade

Renato Rovai

A mais nova modalidade da praça é atribuir aos black blocs a responsabilidade por todos os problemas da violência no Brasil. E aproveitar o ensejo para criminalizar a todos os movimentos sociais que estão nas ruas. O mais estúpido dos atos neste sentido é a tentativa de aprovação a toque de caixa da lei anti-terrorismo no Senado.

Isso isenta a tática da violência por parte de grupos que estão nas ruas de suas responsabilidades? Claro que não. E aqui neste espaço alguns textos já foram escritos neste sentido. A quem interessar possa, seguem dois: este eeste.

Mas ao mesmo tempo será que não é o caso de verificar quem são os outros atores que apostaram nesta mesma violência que hoje condenam com tanta veemência? Um deles, você pode assistir no vídeo a seguir.

O jornalista Ricardo Boechat da TV Bandeirantes tem inúmeras qualidades. Mas fez neste vídeo o que muitos dos seus colegas fizeram, com, digamos, um pouco mais de acidez. Pede mais protestos violentos dizendo, entre outras coisas:

“Sou favorável a arranhar carro, sou favorável a revolta, sou favorável a quebra-quebra e o caralho. Mas isso é vandalismo? Vandalismo é o cacete.”

Recentemente a apresentadora Racquel Sherazade, do concorrente SBT, também defendeu a legitimidade da violência contra “o marginalzinho amarrado ao poste”. E tratou a ação como legítima defesa coletiva.

A morte de Santiago Andrade precisa ser levada em consideração e se tornar um ponto de inflexão para aqueles que nas ruas ou no conforto do Facebook defendiam a tática da violência como instrumento legítimo de luta. Mesmo que houvesse quase nada a justificar essa opção no contexto atual. Mesmo que não houvesse nenhum indício de que isso poderia levar o movimento e o país a algum ponto melhor do que o atual.

Mas ao mesmo tempo a morte de Santiago Andrade não pode se tornar uma bandeira na mão de grupos da violência. Que em geral são mobilizados por discursos midiáticos do tom de Sherazade. E até de um jornalista muito mais responsável, como Boechat.

E que também são mobilizados por veículos de comunicação como a Band, que tem nos programas de violência policial suas principais audiências.

PS: Agrego neste post o editorial da Band pedindo as forças de reação para punir os baderneiros.


domingo, 9 de fevereiro de 2014

Esqueça Sheherazade. A culpa é de Silvio e do governo

Foi Silvio Santos quem criou Sheherazade e abriga outros âncoras fascistas Brasil afora. O governo, por sua vez, permite o uso criminoso de uma concessão pública

por Lino Bocchini - Carta Capital


Sheherazade é um alvo menor. A moça é uma mera testa-de-ferro, uma boneca de ventríloquo. A verdadeira voz dos discursos diários pregando o ódio, a violência, o preconceito e a intolerância é a de Silvio Santos. Foi ele quem decidiu trazer a jornalista da TV Tambaú, afiliada de sua emissora na Paraíba, para o palanque nacional do Jornal do SBT. É o empresário quem a mantém intocada e lhe protege para que siga discursando no horário dito nobre. É Silvio quem a segura para que, ao noticiar a polêmica em torno de suas declarações, ela possa zombar de nossa cara e bravatear que não abrirá mão de seu “direito de liberdade de expressão”.

E tem mais. Sob o comando ou conivência de Silvio, outras vozes semelhantes ganham força nas afiliadas do SBT. É o caso, por exemplo, de Paulo Martins. Comentarista do Jornal da Massa, veiculado toda noite pela afiliada do SBT do Paraná, Martins passeia pelos mesmos temas de sua colega Sheherazade, como por exemplo o rolezinho:

“Aposentaram a cinta, essa é a geração mãozinha na cabeça. Ninguém tem direito de se organizar em bando e tumultuar uma propriedade privada, atrapalhar a vida de quem é responsável e honrado, tem compromissos e não tem tempo pra perder com rolezinho”.

O jornal da Massa faz parte da programação da Rede Massa, o maior grupo de comunicação do Paraná. O conglomerado é de propriedade de Carlos Massa, o Ratinho, que tem seu programa na grade nacional do SBT.

Em seus comentários diários Martins já afirmou, por exemplo, que os presidentes do Brasil, do Equador, da Argentina e da Venezuela formam “a gangue do Foro de São Paulo”. Ao ver que seu parceiro de bancada assustou-se com a palavra “gangue”, emendou: “Os caras são parceiros das Farc, você quer que eu chame eles do quê?”. Há coerência com a forma que ele refere-se à atual administração federal: “a ditadura Dilma Roussef”.

Em Santa Catarina, o SBT de Silvio Santos mantém um outro apresentador-comentarista que cerra fileiras com Sheherazade e Martins. É Luiz Carlos Prates, que todo dia fala o que bem entende na bancada do SBT Meio Dia, levado ao ar pela afiliada catarinense do SBT, propriedade do Sistema Catarinense de Comunicação.

Prates tem 50 anos de carreira e é figura conhecida no estado. Passou por diversas emissoras antes de instalar-se no SBT e tem uma longa lista de frases, digamos, de destaque. É o tipo de comentarista que, ao falar do trânsito em Florianópolis, lamenta que “hoje em dia qualquer miserável tem um carro”. Ou, ao analisar o drama das meninas que têm sua intimidade escancarada em fotos ou vídeos na internet, diz que “só uma débil mental se expõe promiscuamente desse jeito”.

E o governo com isso?

Por mais antipatia de uma parcela da população que uma revista Veja ou um jornal O Estado de S. Paulo possam despertar, faz parte do jogo democrático a sua existência. São negócios como outro qualquer e, por mais que incomodem, têm todo o direito de existir e publicar o que bem entenderem, dentro dos limites da Constituição.

No caso de uma rádio ou televisão, contudo, a história é outra. Eles operam por meio de outorgas concedidas pelo Ministério das Comunicações com o aval do Congresso. E aí há regras. Afinal, é uma autorização de uso de um bem público, não é uma mera iniciativa privada, como querem nos fazer crer.

Pela legislação em vigor, é o Ministério das Comunicações o órgão responsável por fiscalizar o conteúdo veiculado pelas emissoras e responsabilizá-las se houver violação da lei. No caso de Sheherazade, por exemplo, há uma lista de violações. Foram desrespeitados os direitos humanos assegurados pela Constituição Federal, o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) e há violação explícita do Código Brasileiro de Telecomunicações, que determina que o serviço de radiodifusão não pode ser usado para humilhar pessoas e expô-las a condições degradantes, "nem que seus fins sejam jornalísticos".

Ou seja, está tudo muito explícito. É só o Ministério das Comunicações, comandado por Paulo Bernardo, começar a agir e multar as empresas. Só não o faz porque não quer.

É importante sublinhar também que Carlos Massa ou o proprietário de qualquer outra emissora brasileira tem o mesmo direito de usufruir daquele espaço do que qualquer universidade, ONG, empresa ou pessoa física. São eles os donos unicamente por acordos políticos.

E é no mínimo questionável o uso de tais concessões para enriquecer bispos de igrejas suspeitas, faturar bilhões a cada ano com a venda de publicidade ou colocar no ar comentaristas como Sheherazade, Martins e Prates, que diariamente desrespeitam as leis, deseducam e pregam a violência e o preconceito para milhões de brasileiros.

Só o governo, por meio do Ministério das Comunicações, pode mudar isso. E só a sociedade civil organizada pode pressionar o governo e o Congresso para que isso aconteça.

Continuemos criticando Sheherazade, ela merece. Até gosta. A apresentadora estava se deliciando ao noticiar a polêmica em torno do seu nome na noite de quinta-feira 6. O sorrisinho constante era o retrato da confiança de quem está sendo não apenas protegida pelo patrão, mas também sendo beneficiada pela omissão de quem poderia fazer algo em Brasília. Ela e Silvio estão rindo da sua cara.

sábado, 8 de fevereiro de 2014

Professores da categoria "O" lutam por igualdade em São Paulo


Em reunião com os participantes do ato de ontem, decidimos convidar outros coletivos para agregar ao nosso movimento. Cabe ressaltar que, o próximo ato continuará com a mesma pauta....Ato vai acontecer na avenida paulista 14/02/2014 às 16:00 no vão do Masp...Conto com a presença de todos companheiros(as)



quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Não participava dos protesto e foi condenado. Justiça?: O catador que virou bode expiatório de Junho

Direto de Bangu 5, entrevista com o único condenado pelos protestos: o perigoso homem que carregava dois frascos de PinhoSol e agora cumpre pena de cinco anos

Por Matias Maxx, na Vice


Rafael Braga Vieira fez 26 anos dia 31 de janeiro. Nascido e criado na Vila da Penha, no Rio de Janeiro, trabalhava como garimpeiro urbano, coletando antiguidades e objetos usados no lixo para vender no “Dingo Mall” como é conhecida a feira de coisas usadas montada por moradores de rua nas proximidades da feira de antiguidades da Praça XV. No dia 20 de Junho de 2013, a PM carioca utilizou cavalaria, Tropa de Choque, muitas bombas e o famigerado Caveirão contra as centenas de milhares de pessoas que se manifestavam contra o aumento das passagens em frente à prefeitura. Enquanto alguns resistiam com escudos e barricadas, impedindo o avanço da tropa, vários manifestantes se espalharam pelo centro ateando fogo em lixo e quebrando vidraças de bancos. Por volta das 18h, Rafael, que diz nunca ter participado de manifestação nenhuma, voltava de seu garimpo para um sobrado abandonado onde ele morava. Ele declara que lá encontrou duas garrafas de produtos de limpeza que pretendia levar para uma tia, quando foi abordado por PMs e conduzido à delegacia, onde as garrafas se transformaram em coquetéis molotovs.

Rafael foi condenado no estatuto do desarmamento, por posse de explosivos e cumpre a pena de cinco anos no Presídio Elisabeth Sá Rego, também conhecido como Bangu 5. Trata-se de uma penitenciária de regime fechado, destinada normalmente a condenados ligados à facção criminosa Comando Vermelho, que controla a comunidade onde Rafael foi criado. Mesmo sem envolvimento com o crime organizado, o fato de ser cria de uma comunidade dominada por uma facção rival costuma ser uma sentença de morte no sistema prisional do Rio de Janeiro. Acompanhado de agentes e da assessoria de imprensa da SEAP, conversei por vinte minutos com Rafael. Com fala mansa e um triste conformismo, ele me contou a história da única pessoa condenada após ser presa nos protestos que tomaram conta do país desde junho do ano passado.



Me conta, o que aconteceu no dia 20 de Junho?
Rafael Braga Vieira: Tinha manifestação no centro, e eu estava chegando do trabalho e fui para o casarão onde eu morava. Quando eu saí, os PMs já me abordaram e falaram que eu estava com coquetel molotov na mão, mas eu não tava com coquetel molotov nenhum… Era uma garrafa de Pinho Sol que achei quando eu cheguei no casarão. Lá é aberto, é um casarão que foi invadido, na hora que eu cheguei lá, tinha essa garrafa e uma daquelas garrafas verdes de cloro… Aí pegaram a garrafa de Pinho Sol e esvaziaram, botaram lá algo que eu acho que era gasolina, amarraram um paninho e falaram que era coquetel molotov perante ao juiz. Só isso…

Você morava nesse casarão?
Eu morava sozinho nesse casarão aberto que tem na Lapa, dormia lá. Sou camelô, trabalho na feira da Praça XV. Como eu não tinha lugar para guardar minhas coisas, guardava lá. Minhas peças usadas. Trabalho com peças usadas, peças raras, não tenho nada a ver com essa manifestação aí. Nunca participei, nunca vi…

Você foi assistido por algum advogado quando foi preso?
Quando fui preso vieram dois advogados que me acompanharam, assinei até um papel lá com eles… Foram até lá na casa da minha família… Mas só isso mesmo… Não sei se tão acompanhando ainda, não pediram dinheiro… Lá no juiz eu tava com a Defensoria Pública…

E você viu os PMs esvaziando a garrafa?
As duas garrafas estavam lacradas quando eu peguei, não era molotov não. Peguei porque tem uma tia minha que mora lá no outro casarão do lado desse onde eu moro, eu ia dar pra ela. Aí eles me abordaram na saída do casarão, que fica de frente à delegacia das crianças lá na Lapa. Nem tinha visto eles quando eu saí, estava carregando as garrafas na mão, já chegaram me agredindo já, me deixaram no portão e seguraram as garrafas. Me levaram lá pra 5ª [DP], e lá as garrafas já estavam com gasolina. Eles esvaziaram e colocaram gasolina pra dizer que era coquetel molotov, mas isso não tem nada a ver não. Falaram isso pro juiz e ele foi e me condenou sei lá por quê, acho que é porque eu já tenho passagens.

Quais foram essas passagens?
Cheguei a ser condenado já em outras passagens por roubo. Cumpri pena e saí por ordem do juiz, saí de condicional e eu tava trabalhando tranquilão na paz de Deus, aí aconteceu isso aí.

E em quais presídios você passou antes de chegar aqui em Bangu 5?
Primeiro eu fui pra Japeri, depois pro setor B e ai me mandaram pra cá. Me mandaram pra cá. Eu tô aqui mesmo porque eu sou morador da comunidade da Penha, desde pequeno, minha família é de lá… Aí me botaram aqui. O convívio é tranquilo, tranquilão… Mas não tenho recebido visita, porque aqui fica um pouquinho distante pra eles.

Você acha que foi preso injustamente?
Fui preso injustamente com certeza, é porque eu tive duas passagens, por isso aí… Eu não fiz nada, sou inocente de verdade. Mas já fui condenado mesmo, o juiz me condenou, cinco anos… Tô pagando…

E o que você pretende fazer quando sair?
Quando sair pretendo voltar a trabalhar mesmo, resolver minha vida, arrumar um trabalho de carteira assinada que é melhor, ajudar minha família. Eu que ajudo minha família em casa, o mais velho dos irmãos sou eu. Minha mãe não tem marido. Tá morando sozinha agora, comigo somos sete irmãos e eu que ajudava.

E agora? Como eles estão se virando?
Pô! Não tenho nem notícias. Não sei como o pessoal tá se virando aí.
Me conta mais sobre seu trabalho na Praça XV.
Trabalho lá há muito tempo, desde os treze anos de idade. Vendo peças usadas que acho no garimpo, sou garimpeiro. Vou juntando lá no casarão, levo pra feira, espalho lá e começo a vender, pra arrumar dinheiro. Tudo que eu acho, liquidificador, televisão, aí eu alugo uma barraca lá e armo. É maneiro. Televisão funcionando, coisas boas que eu acho no lixo… Tudo vende lá cara, até peça ruim vende lá (risos), os caras compram pra tirar alguma coisa. Pô! Porcelana! Porcelana dá dinheiro legal, jarrinhos, quadros antigos, molduras… Eu tirava um dinheiro lá, de 300 a 500 por semana. Dava pra ajudar minha família tranquilo…
Eu ficava três semanas ali por baixo, ia pra casa lá na Penha, ficava uma semana em casa… Acabava ficando mais tempo lá embaixo do que em casa. Só ia lá em casa mesmo pra levar um dinheiro pra minha família, tô com duas irmãs recém-nascidas. Minha mãe chegou até a trabalhar comigo lá, mas não tava dando mais não…

Você já tinha participado de alguma manifestação? Ou sabe o porquê dessas manifestações?
Na manifestação anterior eu nem tava por perto. Nem sei por que estavam rolando essas manifestações. Não sei de nada, eu tava só voltando do trabalho, vi aquele monte de gente e aí isso aconteceu do nada. Tava vindo do Largo do Machado, eu garimpo lá, em Laranjeiras. Foi eu chegar e aconteceu isso comigo, mais ou menos umas seis horas da tarde.
Quatro meses depois, quase 200 pessoas foram presas numa manifestação, chegaram a passar um tempo aqui em Bangu, mas já foram todos liberados. 

Por que você acha que é o único que foi condenado e continua preso?
É… Só eu… É porque eu já fui condenado antes por roubo. Realmente, estava roubando, mas parei com isso, não quero mais saber de roubo, nem de mais nada dessa vida. Estava trabalhando tranquilão na rua, tô voltando do trabalho aí o cara pega, me agride. E acho que porque eles me agrediram lá na frente de um monte de pessoas eles tiveram que esvaziar aquilo ali e dizer que era molotov. Já tinham me agredido, já foram me chamando, falando que eu tava no meio… “Você tava ali né? No meio daquela bagunça ali né?”, tava nada. Falaram pro juiz que já tinham me visto por lá, que tinham me visto com uma mochila, realmente eu andava todo dia com mochila, vindo do meu garimpo, várias bolsas só com as peças usadas que eu achava no lixo. Eles falaram pro juiz que eu andava com bolsas. Pô! Nada a ver! Forjado. Foi tudo forjado.

Então você acha que eles inventaram essa história na delegacia para justificar o abuso de autoridade que tinham cometido antes?
Isso! Eles chegaram me agredindo à pampa, me deram coronhada, bateram minha cabeça na parede da delegacia. Tinha um montão de policial lá mesmo, dois já me levaram lá pra dentro já me metendo a porrada, chegaram lá dentro acabaram de me arrebentar e colocaram no “porquinho”, me deixaram um tempão lá e depois me chamaram, “tua casa caiu, não sei o quê…”. Aí me levaram pra 5ª e apresentaram a garrafa de Pinho Sol já com gasolina e com um pano na garrafa. Só isso mesmo. Falaram que era molotov, eu falei que não era. Mas não tava ninguém comigo, eu tava sozinho. Mas um montão de gente que tava com molotov mesmo foi tudo embora. Tudo liberado. Eu não tava com nada disso não e fui condenado.

Na senzala do DEM



Sem querer desmerecer as razões dessa médica cubana prestes, ao que parece, a pedir asilo político no Brasil, mas essa história tem uma dessas tristes ironias muito típicas da nossa indigência moral e cívica.

A principal e mais escandalosa delas diz respeito à participação do deputado Ronaldo Caiado, do DEM de Goiás, auto intitulado libertador de cubanos escravizados pelo programa Mais Médicos, do governo federal. 

É mais uma dessas piadas de mau gosto que a mídia brasileira, dominada pelo cretinismo de direita, deixa passar de má fé, embora saiba exatamente o mal que está fazendo. 

Caiado é um dos símbolos da moderna escravidão brasileira, fundador e ex-presidente da União Democrática (sic) Ruralista, a UDR. O deputado é um dos 29 parlamentares que, em 2012, votaram contra a Proposta de Emenda Constitucional 438/2001, a chamada PEC do Trabalho Escravo.

Trata-se de uma medida que garante o confisco de propriedades em que for flagrado trabalho escravo e seu encaminhamento para reforma agrária ou uso social. A médica Ramona Matos Rodriguez tem todo direito de deixar o programa e pedir asilo, assim como o Ministério da Saúde tem o direito de descredenciá-la e, da mesma maneira, mandá-la de volta para Havana – claro, se ela não conseguir o status de asilada. 

O que nem ela, nem ninguém, vai conseguir é convencer o Brasil de que a dobradinha do DEM, herdeiro político da ditadura militar, com a UDR, um de seus cancros mais conhecidos, é o caminho para essa discussão. Ramona talvez não tenha atinado, mas se ela se considera mesmo uma escrava, acabou de cometer a maior burrice de sua vida: fugiu para os braços de um coronel da Casa Grande.


Leandro Fortes

Via:http://wwwterrordonordeste.blogspot.com.br/

Nota de repúdio do Sindicato e da Comissão de Ética contra declarações da jornalista Rachel Sheherazade

O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro e a Comissão de Ética desta entidade se manifestam radicalmente contra a grave violação de direitos humanos e ao Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros representada pelas declarações da âncora Rachel Sheherazade durante o Jornal do SBT.

O desrespeito aos direitos humanos tem sido prática recorrente da jornalista, mas destacamos a violência simbólica dos recentes comentários por ela proferidos no programa de 04/02/2014 http://www.youtube.com/watch?v=nXraKo7hG9Y. Sheherazade violou os direitos humanos, o Estatuto da Criança e do Adolescente e fez apologia à violência quando afirmou achar que “num país que sofre de violência endêmica, a atitude dos vingadores é até compreensível” — Ela se referia ao grupo de rapazes que, em 31/01/2014, prendeu um adolescente acusado de furto e, após acorrentá-lo a um poste, espancou-o, filmou-o e divulgou as imagens na internet.

O Sindicato e a Comissão de Ética do Rio de Janeiro solicitam à Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) que investigue e identifique as responsabilidades neste e em outros casos de violação dos direitos humanos e do Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros, que ocorrem de forma rotineira em programas de radiodifusão no nosso país. É preciso lembrar que os canais de rádio e TV não são propriedade privada, mas concessões públicas que não podem funcionar à revelia das leis e da Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Eis os pontos do Código de Ética referentes aos Direitos Humanos:

Art. 6º É dever do jornalista:

I – opor-se ao arbítrio, ao autoritarismo e à opressão, bem como defender os princípios
expressos na Declaração Universal dos Direitos Humanos;

XI – defender os direitos do cidadão, contribuindo para a promoção das garantias
individuais e coletivas, em especial as das crianças, adolescentes, mulheres, idosos,
negros e minorias;

XIV – combater a prática de perseguição ou discriminação por motivos sociais,
econômicos, políticos, religiosos, de gênero, raciais, de orientação sexual, condição física
ou mental, ou de qualquer outra natureza.

Art. 7º O jornalista não pode:

V – usar o jornalismo para incitar a violência, a intolerância, o arbítrio e o crime;

Também atuando no sentido pedagógico que acreditamos que deva ser uma das principais intervenções do sindicato e da Comissão de Ética, realizaremos um debate sobre o tema em nosso auditório com o objetivo de refletir sobre o papel do jornalista como defensor dos direitos humanos e da democratização da comunicação.