No Brasil, toda a reflexão e ação política parece atualmente ter os olhos única e exclusivamente voltados para o ano de 2018.
Como se o país pudesse voltar a uma normalidade mínima depois de ficar dois anos nas mãos de um ocupante do lugar de presidente da República com perfil mais adaptado a trabalhar em filmes de aprendiz de gângsteres e com aceitação popular zero, de um Congresso Nacional composto de indiciados e oligarcas e de um Poder Judiciário exímio em operar com decisões completamente contraditórias de acordo com os interesses imediatos do juiz que julga.
No entanto há de se trabalhar com uma hipótese de grande plausibilidade, a saber, a de que 2018 não existirá.
A cada dia que passa fica claro que o Brasil está atualmente submetido a uma espécie de guerra civil capitaneada por aqueles que tomaram de assalto o Estado brasileiro contra os setores mais desfavorecidos da população. Sim, uma guerra civil silenciosa, mas tão brutal quanto as guerras abertas. Pois esta é uma guerra de acumulação e espoliação, de vida e de morte.
De um lado, um sistema financeiro com lucros inacreditáveis para um país que se diz em crise, sistema este com amplo controle das políticas do Estado. Junto a ele, a elite rentista do país com seus ganhos intocados, sua capacidade de proteger seus rendimentos de qualquer forma de tributação.
Na linha de frente, representando seus interesses, uma casta de políticos degradados que criam leis e usam deliberadamente o dinheiro público para se blindar, que mudam regras eleitorais para continuarem onde estão e defenderem os verdadeiros donos do poder.
Do outro, temos a massa da população empobrecida e agora submetida a um sistema de trabalho que retira o mínimo de garantias de segurança construídas nesse país, que faz aposentadoria se transformar em uma relíquia a nunca mais ser vista. Uma massa que sentirá rapidamente que ela tem apenas duas escolhas: ou a morte econômica ou a submissão ao patronato.
Junto a elas, a população que se vê humilhada da forma mais brutal por prefeitos que marcam crianças na escola para que elas não comam duas refeições, que violentam moradores de rua com jatos de água nos dias frios para que eles sumam, governadores que destroem a céu aberto universidades que não podem mais começar seu ano letivo por falta de verbas.
Toda essa população submetida a uma força policial que atira em manifestantes, invade reuniões públicas sem que nenhuma punição ocorra.
Seria suprema ingenuidade acreditar que esses que agora nos governam, esses senhores de uma guerra civil não declarada, esses mesmos que têm consciência absoluta de que nunca ganhariam uma eleição majoritária no Brasil para impor suas políticas aceitem ir embora de bom grado em 2018.
Quem deu um golpe parlamentar tão tosco e primário quanto o brasileiro (lembra-se das "pedaladas fiscais"? Quem mais foi punido neste país? Só o antigo governo federal dela se serviu?) não conta em sair do poder em 2018.
Só que há várias formas de 2018 não existir. A primeira delas e assistirmos uma eleição "bielorrussa". Trata-se de uma eleição na qual você impede de concorrer todos aqueles que têm chance de ganhar, mas que não fazem imediatamente parte do núcleo hegemônico do poder atual. Caso essa saída não dê certo, teremos uma mudança mais radical da estrutura do poder, ou seja, uma eliminação da eleição presidencial como espaço possível de mudança.
Então aparecerá a velha carta do parlamentarismo: o sonho de consumo das oligarquias locais que veriam enfim seu acesso direto ao poder central. Pois não confundam o parlamento brasileiro com o sueco. Entre nós, o Congresso sempre foi a caixa de ressonância de interesses oligárquicos com seus casuísmos eleitorais.
Por fim, se nenhuma das duas opções vingar, não há de se descartar uma guinada mais explicitamente autoritária. Não, esta hipótese não pode ser descartada por nenhum analista minimamente honesto da realidade nacional.
Neste sentido, pautar todo debate político atual a partir do que fazer em 2018 é simplesmente uma armadilha para nos prender em uma batalha que não ocorrerá, para nos obrigar a naturalizar mais uma vez uma forma de fazer política, com seus "banhos de Realpolitik", razão mesma do fracasso da Nova República e dos consórcios de poder que a geriram.
Melhor seria se estivéssemos envolvidos em um luta clara pela recusa dos modelos de "governabilidade" que nos destruíram.
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