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quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

José Genoino em entrevista ao Sul21


“Minha expectativa é exercer o mandato”, reforça José Genoino



Rachel Duarte

Pouco antes de completar dois meses após sua condenação do Supremo Tribunal Federal (STF), o deputado federal José Genoino (PT-SP) assumiu mandato na Câmara Federal. Eleito em 2010, com mais de 92 mil votos e em meio ao começo de uma campanha pública pela sua condenação por envolvimento no escândalo conhecido como Mensalão, o parlamentar defende a constitucionalidade da posse. O STF já decidiu por 5 votos a 4 pela cassação automática dos mandatos dos condenados na Ação Penal 470 – embora tanto o então presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), quanto um dos principais candidatos a assumir o posto, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), tenham afirmado que vão recusar a decisão, afirmando que cabe ao Legislativo definir a questão em votação secreta.

“A minha expectativa é de exercer o mandato, porque eu tomei posse respeitando a Constituição Federal e as leis do meu país. Além de responder aos 92.326 eleitores que votaram em mim”, diz José Genoino em entrevista ao Sul21. Ele rebateu acrítica do ex-governador gaúcho e colega de fundação do PT, Olívio Dutra, sobre macular a imagem do partido com o exercício do mandato após a condenação. “Eu respeito a opinião do governador Olívio Dutra e tenho uma divergência sobre isso. A ética e a moral de um país são dadas pelas normas gerais, leis e procedimentos normativos. Eu tenho o dever de segui-las e obedecê-las. Portanto, éticas individuais, de uma família, de um partido ou igreja não podem gerar julgamentos de A, B ou C”, afirma.

José Genoino diz que mesmo não concordando com as decisões da corte e possivelmente de uma eventual cassação do mandato na Câmara, irá cumpri-las. Reforça sua inocência quanto aos crimes de formação de quadrilha e corrupção ativa, das quais poderá cumprir pena de seis anos e 11 meses em regime semiaberto. “Eu sempre fiz política por ideais e sonhos. Nunca acumulei patrimônio ou riqueza com a política. É isso que conta para mim. Minha luta por um estado democrático e soberano e pela minha honestidade nunca se apagarão”, afirma.

José Genoino participou da fundação do PT depois de ser anistiado em 1979. Ex-integrante do PC do B, participou da Guerrilha do Araguaia e capturado pelos militares em 1972, passou cinco anos na prisão. Pelo PT, foi deputado federal por São Paulo entre 1982 e 2002. Em 2002, candidatou-se a governador de São Paulo, mas perdeu a eleição para Geraldo Alckmin (PSDB) no segundo turno. No mesmo ano, foi eleito presidente nacional do PT, em substituição a José Dirceu. Renunciou à presidência do PT em julho de 2005, após denúncias relacionadas ao escândalo do mensalão. Em março de 2011, foi nomeado assessor especial do Ministério da Defesa, cargo do qual pediu demissão no último dia 10 de outubro, um dia depois de ser condenado pelo STF.

“Eu estou nesta espécie de tortura psicológica há sete anos. Desde 2005 sofro campanhas pré-condenação. Quem tem muitas cicatrizes está mais preparado para enfrentar certos golpes, certas pancadas”

Sul21 – A sua decisão de tomar posse como deputado federal tem causado polêmica e críticas, até mesmo de companheiros de PT. Como o senhor recebe esses questionamentos?

José Genoino – A minha expectativa é exercer o meu mandato, porque eu tomei posse respeitando a Constituição Federal e as leis do meu país. Além de responder aos 92.326 eleitores que votaram em mim. Ao cumprir esta determinação legal, que é válida a todos os brasileiros, pretendo desempenhá-la como sempre fiz, sendo um deputado presente, de projetos e ideias. Eu sempre fui atuante em plenário e nas comissões. É isso que eu vou fazer. Exercerei meu mandato plenamente a cada dia. Sobre expectativas de futuro (condenação), não me compete especular.

Sul21 – O senhor imagina futuro prejuízo à sua vida política depois desta condenação?

José Genoino – Eu estou nesta espécie de tortura psicológica há sete anos. Desde 2005 sofro campanhas pré-condenação. Quem tem muitas cicatrizes está mais preparado para enfrentar certos golpes, certas pancadas. Mas eu estou tranquilo, tenho a serenidade da minha inocência. Vou provar isso. Mais cedo ou mais tarde, a verdade prevalecerá. Nesse período todo, os acusados (no mensalão) foram tratados como nunca antes no nosso país – mesmo assim, não quero emitir juízo de valor sobre isso por ter um compromisso profundo com a democracia, eu lutei por ela. Eu fiquei cinco anos preso por lutar pela democracia. Ingressei na política com 21 anos de idade. Sempre fiz política. Política por ideais e sonhos. Nunca acumulei patrimônio ou riqueza com a política. É isso que conta para mim. Continuo com a consciência que a minha luta por um estado democrático e soberano e pela minha honestidade nunca se apagarão.

Sul21 – O deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) que disputa a presidência da Câmara, já disse que, se eleito, tem intenção de descumprir a decisão do STF sobre a cassação automática do mandato dos condenados na Ação Penal 470. O senhor fica mais tranquilo com esta posição?

José Genoino – Eu não vou opinar sobre isso. Não é de minha competência, é de competência da Câmara Federal. Eu respeito os poderes constituídos. Reafirmo que, mesmo concordando ou discordando de decisões, eu as cumprirei.

Sul21 – Os críticos ao julgamento do mensalão afirmam que a condenação foi exagerada, que houve ausência de provas, que o STF atuou de forma política ou mesmo criticam uma suposta condenação antecipada por parte da imprensa. O senhor partilha de alguma dessas opiniões? 

José Genoino – Não emitirei opinião sobre o julgamento ou o processo, até porque ele não terminou. Quem responde pelo processo é o meu advogado. Lamentavelmente eu não sou advogado porque o AI-5 me cassou da faculdade de Direito. Eu não tenho elementos para fazer este tipo de avaliação. Eu penso que o Brasil está vivendo um bom momento de consolidação da democracia, bom momento econômico, com distribuição de renda e programas sociais exitosos, além de ter prestígio no exterior. A minha vida sempre foi dedicada às causas. Eu sempre fiz escolhas políticas. Estas escolhas foram desde governar com Lula e com a companheira Dilma, como pela democracia com a luta pelas Diretas e a Constituinte. Fiz política no movimento estudantil de 68, depois na luta de resistência armada. Isto faz parte da minha vida e da consciência que tenho de mim mesmo.

“Eu não estou assumindo cargo comissionado, não estou sendo nomeado, é um mandato eletivo. Aliás, eu exerci um cargo em comissão no governo federal e no dia seguinte à minha condenação eu abri mão dele”

Sul21 – O senhor afirma que não cometeu crime enquanto foi presidente do PT. Sua participação no escândalo está relacionada aos empréstimos que avalizou, mas que já teriam sido liquidados pelo partido.

José Genoino – Estão nos autos do processo os empréstimos que eu assinei. Um com o Banco Rural, no valor de R$ 3 milhões, e outro ao BMG, de R$ 2,5 milhões. Foram registrados na contabilidade oficial do partido e registrados junto ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e foram pagos judicialmente ao longo de quatro anos. Começaram a ser pagos em 2007 e terminaram em 2011. Negociação esta que não era mais na minha gestão e (que ocorreu) com aval da Justiça. Prestei contas das ordens de pagamento nos autos do processo. O que eu fazia como presidente do PT naquela época eram articulações políticas no momento difícil de início do governo Lula. Não podemos confundir escolhas políticas com crime. Eu tenho minha consciência tranquila de que eu não cometi crime enquanto presidente do PT. Respeito as pessoas que pensam diferente. Respeito as decisões da Suprema Corte brasileira, mesmo discordando. Independente de discordar, vou cumpri-las. O importante para mim é a consciência que eu tenho de mim mesmo. É uma história de vida de luta.

Sul21 – O ex-governador gaúcho e seu correligionário Olívio Dutra disse diretamente ao senhor na Rádio Guaíba nesta segunda-feira (07), que o senhor deveria renunciar ao mandato parlamentar em nome da imagem pública do partido que, segundo ele, está profundamente atingida com a atuação dos quadros condenados na Ação Penal 470. Qual a sua posição? 

José Genoino – Eu respeito a trajetória do companheiro Olívio Dutra, mas discordo democraticamente. Em primeiro lugar porque a ética e a moral de um país são dadas pelas normas gerais, leis e procedimentos normativos. Eu tenho o dever de segui-las e obedecê-las. Portanto, éticas individuais, de uma família, de um partido ou igreja não podem gerar julgamentos de A, B ou C. Aliás, a história da humanidade está rica de tragédias quando se coloca a ética e a moral acima da lei de condutas e direitos. Eu respeito a opinião do governador Olívio Dutra e tenho uma divergência sobre isso. Eu assumo mandato porque está dentro da lei e estou respeitando os eleitores que votaram em mim. Os mais de 92 mil votos que recebi foram em 2010, em plena campanha pública pela minha condenação. Eu tenho recebido inúmeras solicitações de pessoas que votaram em mim me incentivando a assumir. Eu não estou assumindo cargo comissionado, não estou sendo nomeado, é um mandato eletivo. Aliás, eu exerci um cargo em comissão no governo federal e no dia seguinte à minha condenação eu abri mão dele utilizando, ao fazer a carta de exoneração, a famosa frase de Mário Quintana: “Eles passarão, eu passarinho”. Portanto, eu respeito a opinião do Olívio, mas tenho uma visão diferente.

Sul21 – Alguns líderes petistas defendem a renovação do partido, outros falam em refundação. Qual o tamanho do impacto do mensalão na vida do partido?

José Genoino – O PT tem que olhar o seu futuro. Nós temos dez anos de governo vitorioso. Temos novos desafios pela frente. Teremos que olhar o país no pára-brisa e não no retrovisor. Eu estou no PT desde a fundação, participei de toda luta que levou o PT ao governo e nós melhoramos a vida das pessoas. Portanto, creio que o debate interno tem que ser com olhos no futuro e não no passado.

“A luta faz parte da minha vida e quem luta corre risco. Entre abaixar a cabeça e correr riscos, eu prefiro o risco da luta. Estou de cabeça erguida e seguirei vivendo a política com sangue na veia”

Sul21 – O PT mudou? Em que sentido?

José Genoino – Ao longo da história do PT o partido mudou, mas não mudou de lado. O PT amadureceu e governa com outras forças, fazendo alianças. Para governar tem que fazer alianças. Isto é uma exigência de uma sociedade democrática que se governa com maioria, tanto ao nível social como político. Este é o amadurecimento que o PT viveu. Mas não mudamos de lado. É visível o nosso compromisso com a distribuição de renda, com a melhoria salarial, com a geração de emprego, com a soberania nacional com política externa independente, com a recuperação do papel do Estado como indutor do desenvolvimento econômico. Eu entendo que o país está melhor e o PT, e tantos outros partidos que participaram desta caminhada, tiveram papel fundamental.

Sul21 – O senhor assumiu o mandato no mesmo dia em que o delegado alagoano Francisco Tenório assumiu vaga no parlamento após cumprir pena por crime de encomenda de assassinatos. Com base neste exemplo, o senhor se julga injustiçado? Acredita que está havendo supervalorização do seu caso?

José Genoino – Eu não gosto de opinar sobre a atuação da mídia. Os fatos falam por si só. Eu quero apenas dizer que, na minha relação com a mídia, eu conheci a poesia e o sangue. É isto que me fica claro. Tenho uma relação respeitosa com o princípio conquistado democraticamente da liberdade de expressão. Princípio este que deve ser pluralista, independente, com base em fatos e no direito de resposta e ao contraditório. Este processo que o Brasil está vivendo trará as próprias lições. Eu prefiro não fazer julgamento de órgãos de imprensa em particular, sobre determinadas condutas. Deixarei que os fatos falem por si.

Sul21 – Como estão a sua vida pessoal e o seu estado emocional com todo este processo de julgamento – e agora, com o senhor assumindo mandato parlamentar após o Supremo Tribunal Federal o ter condenado? 

José Genoino – A minha vida foi sempre de luta e de emoções e enfrentamentos. Isto faz parte da minha existência. Eu fiquei cinco anos preso e incomunicável. Fui anistiado e fui para luta política. A fundação do PT foi um processo difícil. Ser parlamentar por 24 anos foi também algo muito difícil. A luta faz parte da minha vida e quem luta corre risco. Entre abaixar a cabeça e correr riscos, eu prefiro o risco da luta. Estou de cabeça erguida e seguirei vivendo a política com sangue na veia. Nunca separei a minha vida da política. Faço política a qualquer hora, em qualquer lugar e de qualquer maneira. Foi assim que eu aprendi. Eu sou da geração de 68, que pode ser derrotada, mas não abaixa a cabeça e segue lutando. Eu aprendi isso com companheiros que são os verdadeiros heróis da democracia. Alguns nem estão mais aqui. É isso que me dá tranquilidade para viver minhas emoções, meus desafios, minha vida familiar e com meus amigos.

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