Coluna escrita. Hora de enviar. Mas não. Aparece na tela do computador o indizível, o que "nem dez mandamentos vão conciliar e nem todos os unguentos vão aliviar". Eis as imagens que falam por si.
O que dizer destas imagens?
Um menino, vestido cuidadosamente por seus pais, antes da travessia para fugir das atrocidades do Estado Islâmico. Encontrou as portas da Europa fechadas. A UE transformou o Mediterrâneo no Mar da Morte. Foram mais de 2.600 só este ano. Muitas crianças, como o menino Aylan Kurdi, que tinha três anos.
As palavras não dão conta da dor.
O que dizer das várias fotos e vídeos que tomaram a internet nos últimos dias de pais e filhos, mães e filhas sendo alvo de cassetetes, bombas e humilhações atrozes em vários pontos da fronteira terrestre européia?
O que dizer, um pouco mais ao leste, do vídeo que circulou esta semana de um soldado israelense quebrando o braço de um pequeno garoto palestino e tentando prendê-lo ante a feroz resistência da mãe e da pequena irmã?
E, por aqui, o luto com a morte da garota Letícia da Silva, de 15 anos, a décima-nona vítima da chacina de Osasco. Mais uma da carnificina periférica.
Vem a dor de ver ceifadas vidas pequeninas, cheias de sonhos, por máquinas mortíferas como o sistema europeu de imigração, o exército israelense ou a polícia militar brasileira. Não há o que dizer.
Quem é mãe ou pai sente. Imagina que poderiam ser os seus e dificilmente consegue conter as lágrimas de revolta e compaixão. Mesmo quem não é dificilmente não se sensibiliza ante a cruel morte da criança.
Ainda que fosse morte natural seria intragável. Mas não é. É morte matada, como dizia João Cabral.
Se diante da imagem de Aylan até as palavras calam, que floresça então a solidariedade, a indignação e a resistência a uma forma social em que há vidas que valem e as que não valem, crianças sagradas e as descartáveis.
A chocante imagem do corpo de Aylan retrata a perversidade de um sistema que criou, por sua lógica de segregação, esta figura da "criança descartável".
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