A revista Época produziu uma monstruosidade jornalística, replicada pela TV Record, acusando Lula de traficar influência, na condição de ex-presidente, em favor da Odebrecht, com base num fantasmagórico processo aberto pelo núcleo de Combate à Corrupção da Procuradoria da República em Brasília. Não sei qual das duas instituições, a revista ou a Procuradoria, esta escondida no anonimato, são mais cretinas. Tratam de coisas que não entendem direito e usam isso, com deslavada má fé, para atacar o mais aclamado ex-Presidente da República do Brasil.
Qual é o crime? Abrir espaço no mundo para uma empresa brasileira com capacidade técnica para gerir grandes obras e gerar milhões de dólares para o balanço de pagamentos do país. Será que Época e a Procuradoria não sabem que é justamente isso que fazem presidentes da República de países desenvolvidos, abrindo espaço no exterior para suas empresas? Será que o Governo americano, ou o Governo francês, ou o Governo sueco ficaram fora das negociações para a compra de caças pelo Governo brasileiro?
Décadas atrás, encontrei num evento no Rio o velho Norberto Odebrecht, então reputado como muito avesso a entrevistas e imprensa. Apresentei-me de qualquer maneira como repórter do Jornal do Brasil. Perguntei-lhe como fora sua primeira e fracassada tentativa de ir para o exterior participando de concorrência externa para construir uma hidrelétrica no Chile. “O que você quer?, me disse ele. Eu tinha melhor preço e competência para a obra. Acontece que Reagan ligou para Pinochet e o obrigou a contratar uma empresa americana.”
Uma testemunha desses eventos me contou detalhes adicionais. Estávamos em ditadura, no Brasil e no Chile, e os militares brasileiros, que haviam promovido a venda de armas leves para seus colegas chilenos, gozavam de grande simpatia entre eles. A equipe da Odebrecht recebeu, por conta disso, sem surpresa, a notícia de que a empresa havia ganho a concorrência. Surpresa maior veio quando a americana foi declarada oficialmente vitoriosa no dia seguinte. O que se soube é que Reagan, antes mesmo de tomar posse, prometeu a Pinochet eliminar nas relações com Chile, em troca da vitória americana, todos os embaraços criados por seu antecessor Jimmy Carter por conta de sua defesa de direitos humanos.
Tempos depois, caiu na antiga Iugoslávia um avião norte-americano. Nele estavam e morreram o Secretário do Comércio Brown e cerca de 12 grandes empresários da construção pesada dos Estados Unidos. Era uma visita formal para promover no centro da Europa empresas de construção norte-americanas. Que eu saiba, nenhum americano se levantou para colocar sob suspeita essa iniciativa. Os americanos, ao contrário dos brasileiros, acham natural que seu Governo promova empresas fora do país. Nós as invejamos, quando isso acontece.
O financiamento tão criticado pelos idiotas para a construção do porto de Mariel, em Cuba, foi extremamente favorável ao BNDES, a fornecedores brasileiros de equipamentos e ao Brasil. Enfim, à geração de emprego e renda no país. O BNDES financiou a obra em reais para receber em dólares com taxa de juros acima de seus custos. Favoreceu o balanço de pagamentos do Brasil. Por se tratar de uma obra sofisticada, com grandes requisitos tecnológicos, serviu para expor lá fora a bandeira de uma empresa brasileira de grande porte, talvez odiada no exterior por poder concorrer em grandes obras em qualquer parte do mundo.
É o veneno da inveja e do despeito, somado ao oportunismo mais deslavado de vaidosos procuradores públicos, que coloca em primeira página de revista esse suposto crime de favorecimento de uma empresa privada por Lula. Acho que, fora do Brasil, muita gente, inclusive presidentes da República, ficaria muito orgulhosa de ter um grupo de grandes construtoras brasileiras com a capacidade operacional e tecnológica das nossas. Entretanto, os despeitados, invejosos do enriquecimento dessas empresas – o que indiscutivelmente é bom pra o Brasil -, não deixarão de latir como cães enquanto a caravana passa, mesmo que passe tumultuada pela Lava Jato, hoje atuando como um centro de destruição de riquezas e tecnologias do país em nome do combate burro à corrupção: o certo é criminalizar os empreiteiros, não as empresas!
J. Carlos de Assis - Economista, doutor pela Coppe/UFRJ, autor de mais de 20 livros sobre Economia Política brasileira.
Nenhum comentário:
Postar um comentário