O Estadão de hoje publica uma bela reportagem de Alexandre Hisayasu sobre o acordo celebrado em 2006, entre o estado de São Paulo e o PCC. Não foi acordo: foi rendição.
A reportagem faz um balanço das vítimas do PCC: 23 PMs, 7 policiais civis, 3 guardas, 8 agentes penitenciários, 4 civis e 107 supostos criminosos. Faltaram mais de 600 inocentes nessa conta.
Descreve os encontros entre os dois secretários do governo paulista - Saulo de Castro Abreu, da Segurança, Nagashi Furukawa, da Administração Penitenciária - com Marcola e como, depois do encontro, cessaram os ataques.
Antes disso, Marcola tinha dois pedidos: autorizar visitas no Dia das Mães e permitir que os detentos pudessem falar com seus advogados. Saulo preferiu partir para o enfrentamento. Terminou rendendo-se aos fatos e aceitando o acordo.
A reportagem para por aí, para não entrar no terreno minado do maior massacre da história de São Paulo, que ocorreria nos dias seguintes por determinação expressa do Secretário Saulo de Castro Abreu.
O então governador Cláudio Lembo certamente irá se lembrar de um encontro que tivemos no Palácio dos Bandeirantes. Ele havia demitido Nagashi e reforçado o poder de Saulo. Fui até o Palácio e alertei que Saulo estava fora de si. O alucinado Saulo invadira a Assembleia Legislativa acompanhado de dezenas de PMs; ameaçara de prisão o dono de um restaurante, meramente por não conseguir estacionar seu carro.
Contei-lhe das conversas que tivera com Nagashi e o Secretário de Justiça Alexandre Morais. Ambos relataram que reuniam-se com Alckmin para traçar a política de segurança. E as reuniões foram interrompidas pela radicalização de Saulo, transformando as discussões em questões pessoais. Em vez de enquadrar Saulo, Alckmin optou por interromper as reuniões e, com isso, esfacelou o sistema de segurança do estado. Os criminosos eram presos, ficavam sob a guarda da Secretaria de Administração Penitenciária, mas as investigações tinham que ser conduzidas pela Secretaria de Segurança. E Saulo considerava-se rompido com Nagashi e nada fazia.
Foi em vão. Lembo não estava a par. Disse-me que a informação que recebera era a de que Saulo era eficiente e Nagashi muito mole. Naqueles dias trágicos, Saulo tornou-se seu principal interlocutor.
Foi o período em que PM saiu às ruas das periferias de São Paulo e da Baixada Santista com os rádios desligados para não serem acessados por jornalistas, com a missão de matar qualquer vulto que se movesse. Foram mais de 600 assassinatos em poucos dias. A raiva não foi despejada em membros do PCC, mas - na maioria absoluta dos casos - em jovens inocentes de periferia, estudantes indo para as escolas. Assassinaram a sangue frio até uma jovem cujo parto estava marcado para o dia seguinte.
Foi um espetáculo dantesco, mil vezes pior que o massacre de Carajás.
Homens encapuçados, em motos, alvejavam as pessoas. Em seguida, apareciam viaturas da polícia para destruir as provas. Os corpos eram encaminhados ao IML (Instituto Médico Legal) para as provas finais serem destruídas em laudos inconclusivos.
A matança só cessou quando bravos procuradores federais e médicos do Conselho Regional de Medicina correram para o IML para acompanhar os laudos. A experiência com os mortos da ditadura demonstrava que o laudo era a peça central para a abertura de inquéritos. Ao chegarem no IML, os médicos se depararam com dezenas de cadáveres com tiros na nuca, nas costas, em clara comprovação de execução. Assim que assumiram a vigília o número diário de corpos caiu de uma centena para menos de dez.
Aqui, o Blog criado pelas mães de maio para denunciar o massacre: http://maesdemaio.blogspot.com.br/2011/11/mestrado-denuncia-massacre-de-maio-de.html
Nada foi apurado pelo Ministério Público Estadual, pela Justiça de São Paulo, pela imprensa paulista. Uma brava procuradora federal levantou o caso enviou para Brasilia, para federalizar a apuração. O Procurador Geral Rodrigo Janot sentou em cima do caso, que não anda.
Restaram apenas os lamentos e as denúncias das mães de maio.
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